segunda-feira, agosto 08, 2005

O CORREIO-MOR FEITO PELOS SEUS LEITORES

O CAVALO SÓ

Antigamente, uma enorme manada de cavalos espalhava-se de norte a sul do país; dos maiores aos mais pequenos, todos os bichos eram montados por cavaleiros encapados que, garbosos, tonitroavam aos céus dando asas ao som poderoso que sopravam das suas trombetas.

Esses belos cavalos eram vistos constantemente, um pouco por todo o lado, uma parte deles sempre parados nos estábulos e os restantes em frenético e quase permanente movimento.

Certo dia, de repente, esses cavalos desapareceram todos, tendo sido de imediato substituídos por outros de raça diferente.

Os novos cavalos ainda são montados por cavaleiros, garbosos como sempre, mas agora vestidos com fatos de licra que usarão, porventura, para lhes permitir mais brida (a exemplo de velocistas, nadadores e corredores de bicicletas); o instrumento musical, muito embora continue a ser do género de sopro, é agora também de outro modelo.

Claro que deve haver diferença, mas o mistério desta troca - há quem diga que cavalo é cavalo... - encontra-se contudo por explicar.

Até porque no estábulo de Cabo Ruivo, o mais importante do país, ainda resta um dos antigos cavalos e o mais estranho é que esse era porventura o maior de todos eles.

Esse cavalo deverá estar tão triste (por estar só? por saudades dos outros? por nostalgia de ter sido o maior de todos? por não gostar dos novos?) que dia após dia anseia pela chegada da noite, logo se recolhendo ao aconchego da escuridão.

Há quem diga que este cavalo só, com o seu ar altaneiro ainda desafia aqueles que eliminaram os seus irmãos; outros, mais sonhadores, dizem que a sua existência é uma forma segura de se garantir que tal raça não venha a ser extinta.

Para mim trata-se apenas de um belo cavalo que precisa de luz.

Albano Rosa

Um comentário:

Raul Moreira disse...

Amigo Albano,

O "Cavalo Só" - tal como os seus irmãos "Cavalo Louco", "Touro Sentado" e "Nuvem Vermelha" - resistiu, mas vai acabar por sucumbir aos avanços inexoráveis da Civilização Moderna, de cuja vanguarda faziam parte certos Cowboys de bota afiambrada, com mais lycra e menos lã, com mais estética e menos pelos no peito, enfim com mais aparência do que conteúdo.

Por sorte essa "raça" de novos conquistadores parece estar agora em "hibernação", mas estejamos seguros de que voltarão mais cedo ou mais tarde para nos "assombrar".

Nessa altura resta-nos gritar:

Jeronimo!!!

E partir de novo para a clandestinidade...