Grande Poeta, Ficcionista, Professor universitário, Jorge de Sena é hoje transladado de Santa Bárbara (Califórnia) para o cemitério dos Prazeres. Dá direito a cerimónia merecidíssima, com intervenções de Eunice Muñoz e de Eduardo Lourenço e, obviamente (et pour cause), com a presença do Minsitro da Cultura e do 1º Ministro.
Fora esse tipo de aproveitamentos, naturais como o sol nesta época, fica a homenagem singela ao grande Homem de Letras, exilado duas vezes por vontade própria por nunca ter querido pactuar com ditaduras, nem aqui nem no Brasil.
Dois Poemas de Jorge de Sena:
Conheço o Sal
Conheço o sal da tua pele seca
depois que o estio se volveu inverno
da carne repousando em suor nocturno.
Conheço o sal do leite que bebemos
quando das bocas se estreitavam lábios
e o coração no sexo palpitava.
Conheço o sal dos teus cabelos negros
ou louros ou cinzentos que se enrolam
neste dormir de brilhos azulados.
Conheço o sal que resta em minha mãos
como nas praias o perfume fica
quando a maré desceu e se retrai.
Conheço o sal da tua boca, o sal
da tua língua, o sal de teus mamilos,
e o da cintura se encurvando de ancas.
A todo o sal conheço que é só teu,
ou é de mim em ti, ou é de ti em mim,
um cristalino pó de amantes enlaçados.
O teu Corpo
O corpo não espera. Não. Por nós
ou pelo amor. Este pousar de mãos,
tão reticente e que interroga a sós
a tépida secura acetinada,
a que palpita por adivinhada
em solitários movimentos vãos;
este pousar em que não estamos nós,
mas uma sêde, uma memória, tudo
o que sabemos de tocar desnudo
o corpo que não espera; este pousar
que não conhece, nada vê, nem nada
ousa temer no seu temor agudo...
Tem tanta pressa o corpo!
E já passou,
quando um de nós ou quando o amor chegou.