terça-feira, novembro 14, 2006

Em Louvor da Perdiz


A "saltarilha" já só quase se come em interpretação de aviário.

Mesmo com Amigos caçadores é preciso sorte e acesso a coutos impecáveis para se poder provar uma verdadeira Perdiz em estado selvagem.

A não ser que nos salte aos pés alguma por matos e giestas de Montezinho ou de Carrazeda, mas a probabilidade de isso acontecer neste mundo domesticado e cada vez mais motorizado vai sendo cada vez menor.

E é pena, pois estamos a perder uma das grandes experiências gastronómicas da nossa terra .

A única Receita de alta cozinha oriunda de Portugal parece ter sido a "Perdiz à Moda do Convento de Alcântara" receita de tal forma envolvente que o grande Escoffier (citado por Zé Quitério) dela terá dito na ressaca das Invasões Francesas:

"Foi a única coisa de jeito que nós (os franceses) trouxemos de Portugal"

Por acaso também levaram muito ouro e pedras preciosas, mas acho que apanharam a ideia geral...

Hoje em dia só o Nobre da Ajuda (que já fechou) trazia normalmente na carta esta Perdiz. Soube que também o Fialho a faria por encomenda (e peço desculpa se me estou a esquecer de mais algum).

Provei-a algumas vezes e nem sempre a achei bem interpretada, mas sempre por pecado original de falta de qualidade da Matéria prima e não pela confecção...

Cara de fazer (leva Trufas, Foie Gras e Porto Vintage) nem por isso será de grande dificuldade a execução (pelo menos à primeira vista, pois confesso que nunca a experimentei cozinhar).

Por estes dias vai sendo moda aparecer a perdizinha aviária nas Ementas , sobretudo dos Restaurantes que se dizem "Alentejanos" mas não só.

Com interpretações variadas da Perdiz à Moda da Serra Morena ( também dita "à espanhola") trata-se, as mais das vezes, de estufados de ave incolor e sem sabor , que vêm para a mesa a saber quase que unicamente ao molho ( e à cebola, digo eu) com que são confeccionadas, com mais ou menos Xerês, com mais ou menos Madeira, com mais ou menos castanhas e cogumelos. Na minha opinião a Evitar sempre que possível!

Salva-se o porto seguro do amado Beira Mar , em Cascais, que as prepara só em Azeite e Vinagre, acompanhadas por batata cozida nova torneada. Também o Reijos (na Rua Direita de Cascais) fazia umas perdizes notáveis, praticamente cozinhadas só em Vinho da Madeira e que vinham para a mesa com batata frita palha e salada de agriões.

Mas, lá está, estas interpretações viviam - e muito - do que os proprietários desses excelentes restaurantes conseguiam comprar aos caçadores "de salto" , tornando-se hoje incomparáveis quando são executadas com a perdiz castrada de sabores que se compra nos aviários.

Quando Mestre Mendonça - caçador emérito, cozinheiro de mão cheia - nos convida para as primeiras perdizes do ano podemos antecipar com gostosa salivação que o que vamos comer são as "verdadeiramente verdadeiras" perdizes de campo.

Na experiência culinária mais simples do mundo, apenas grelhadas com sal grosso desde que sejam perdizes do ano, o seu perfumado sabor logo evoca outros tempos e outras leviandades bem fora da actual comilança de um "frango" reduzido em qualidade...

Amanhã trataremos desse assunto. E aqui darei novas das provas (rima e é verdade).

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