terça-feira, abril 29, 2014

Um dia de sol

O Sol do título é figurativo , embora  por acaso Lisboa tenha acordado hoje bem composta.

Aproximando-se o famigerado dia 17 de Maio, é natural que os indígenas anseiem por esse "claro sol", mesmo que não saibam , embora adivinhem, que os trabalhos passados não acabam ali.

Para quem se interessa mesmo por estas coisas recomendo a Conferência que o Sr. Presidente do Tribunal de Contas, Guilherme D'Oliveira Martins, vai dar na Gulbenkian exactamente nesse dia 17 de Maio, pelas 18h.

Vejam aqui sff:
http://capp.iscsp.ulisboa.pt/eventos/congressos-conferencias/item/655-conferencia-o-programa-da-troika-um-ano-depois-que-presente-que-futuro-17-maio-18h

 Existem todavia  notícias (Finantial Times) de que o FMI pretende apenas a saída da Troika para Junho,  tendo a oposição revelado a sua leitura destes acontecimentos através da boca de Francisco Assis:
"...a data do 17 de maio, em concreto é, de facto, uma grande encenação política construída sobretudo pelo Dr. Paulo Portas que visa por essa maneira montar uma grande ação de propaganda com a expectativa de, com isso, condicionar os resultados das eleições europeias, só que os portugueses já não se deixam enganar". 

As eleições europeias em Portugal deverão ser a 25 de Maio, pelo que se compreendem os argumentos de uns e de outros.

Para quem já esperou cerca de 1100 dias, também não serão mais 20 que irão atrapalhar a alegria,

Uma coisa é certa: nesse dia , mesmo que chovam canivetes, será um dia de Sol.

 O grande Jean Gabin cantou-o maravilhosamente, em cima de um belo poema de Jean Lou Dabadie:

http://reseau-kapler.com/le-jour-ou-quelquun-vous-aime-il-fait-tres-beau/


domingo, abril 27, 2014

Crónicas da Serra 2

Ontem esteve um autêntico dia de Inverno, com chuva, vento e frio. Hoje, como que por magia,  a manhã está linda, embora muito fria (7º às 8h).

O tempo que faz é importante para os trabalhos das terras, sem os quais a malta daqui de cima se viria aflita para sobreviver. As batatas (que se semeiam agora), as couves, as restantes hortícolas, são uma das principais fontes de sustento para os idosos que em grande maioria ainda por aqui se mantêm.

Nesta visita de "médico" nem houve tempo para as habituais amenidades com que nos satisfazemos aqui para cima, o Centro de Estudos Viti-Vinícolas de Nelas e o Santa Luzia em Viseu. Foi ver os doentes (complicados...) e tratar das questões mais "publicanas", relacionadas com as contas da quinta.

Hoje vou assar para o almoço lombinhos de porco preto que trouxe de Lisboa. Vem cá a minha afilhada com o namorado e há que preparar uma mesa simpática.

Batatas assadas e esparregado de ervas grossas fazem o acompanhamento. Para sobremesa um arroz doce feito com leite de ovelha, aqui deixado ontem pelo pastor João, que nos arrenda os pastos.
O queijo da serra que vamos abrir hoje  também é do Sr. João, dado à troca dos pastos (recebemos parte da renda em borregos e queijos).

Não sei se sabiam que tradicionalmente o arroz doce na Serra não leva gemas de ovos. Estas estão reservadas para o leite-creme.

Na "inspecção" aos meus vinhos velhos detectei algumas garrafas em risco e que, por isso mesmo, têm de ser abertas. Vidigueira Tinto do Alentejo de 1999, Quinta do Siqueira do Douro 2001, Bairrada Casa do Saima de 1994 , esta penso eu que será a "estrela da companhia" se ainda estiver bebível. A nossa adega cá de cima é construída em granito e aguenta bem os vinhos, desde que estes sejam bons e com capacidade de envelhecimento, como é o caso.

Como o namorado não bebe (é oficial da GNR) mais fica para nós irmos provando...

O Atum de ontem agradou! O que agradou menos foi o preço do kg do lombo do dito, quando me obrigaram a dizê-lo...

Amanhã vamos de regresso, pelo que não haverá Post.  As minhas duas "santas" aí de baixo já protestam que as "abandonei"...

Até Terça Feira!



sábado, abril 26, 2014

Crónicas da Serra 1

Depois de um almoço de borrego assado no forno com as batatas assadas  e grelos salteados, vamos hoje fazer história e tentar convencer os serranos amigos a provarem um bife de atum à moda de Vila Real de Santo António.

Os bifes querem-se altos e do tamanho mínimo da palma da mão de um homem cada.

Salgam-se antes de ir para a frigideira onde apenas são marcados durante alguns minutos "frente e verso", apimentando ligeiramente. Já temos entretanto uma cebolada ao lume feita com bom azeite e alho, mas sem cheiro sequer de colorau, embora possam deitar uma colherzita de concentrado de tomate. E não deixamos a cebola alourar muito, só ficar transparente.

A batata vai ser cozida, aqui das nossas que são tão boas e doces que até se comem sozinhas, sem acompanhamento.

Numa travessa colocamos os bifes de atum com a cebolada por cima. Noutra vão as batatas. Misturam-se no prato, cada um deitando a cebolada que desejar: pouca, muita ou nenhuma...

É um pitéu! (digo eu...).

Ontem à noite trocámos ideia sobre a vida de cada qual e a situação do país. Neste último capítulo pareceu-me detectar muito cansaço e grande indiferença, Mesmo com o 25 de Abril em todas as TV's a malta não se animava. Acham que o destino de Portugal é ir de mal a pior, com políticos incompetentes , para não dizer outra coisa. E quando perguntei à mesa (éramos 8) quantos votariam nas Europeias, nem um só dos meus parentes e amigos levantou a mão...

Perigoso e preocupante, se isto traduzir alguma "maleita" geral de provincianos para aqui deixados com cada vez menos apoio e menos serviços essenciais... Com um pé partido vão para a Guarda, porque o Hospital de Seia deixou de ter "valências" e (dizem eles) tem cada vez menos pessoal qualificado também.

Caso encerre a Repartição de Finanças vai ser mais um prego no caixão da vida agrícola nas aldeias...

Gente só, descontente com a política, alta taxa de desemprego e emigração crescente (outra vez). Dizia-me um "afrancesado" de 78 anos que tinha ido para a França a "salto" por causa da miséria e estava agora a ver o neto a ter de o fazer de novo... O neto, que é professor , está farto de andar aos "contratos", de terra em terra.

A Vida está cada vez mais difícil.  Falar a esta gente da Troika e da saída limpa ou suja é o mesmo que os insultar. O que querem é os problemas resolvidos e sobretudo empregos para os filhos e netos.

E não os podemos criticar.

sexta-feira, abril 25, 2014

Viva o 25 de Abril!


Cá para cima está frio. Chegámos ontem com cerca de 7º e pela noite devem ter baixado aos 3º .

Bom tempo para provar o vinho novo, colheita de 2013. Está bom e recomenda-se!

Eu gosto muito de beber este vinho sem preconceitos nem tratamentos esmerados, para descansar dos grandes trabalhos que me esperam por aí em baixo, à mesa dos restaurantes e a provar as “pingas da moda”.

 Posso habituar-me a esta vida de serra. Havendo Internet e TV Cabo está claro!! Que um Homem não vive só de cabrito e de queijo da serra. E mesmo que se junte o resto que estão a pensar, em cima dos sessenta (anos) é sempre bom ter alternativas...

 Uma das vantagens de ter casado em 1980 e ainda manter boas relações com os “por afinidade” , é que encontro às vezes nos armários da casa velha preciosidades que dá imenso gosto “desempoeirar”.
 
E não falo só dos meus livros , que pela falta de divertimento digital naquela época acartei aqui para a Serra da Estrela e cá deixei. Embora a sua redescoberta seja um deslumbramento, desde o magnífico “Oxford Quintet” de J.IM. Stewart, até aos clássicos de literatura erótica de Anne Rice (Eden), passando pelo magnífico “All Things are Lights” de Robert Shea , lidando com a heresia dos Cátaros no Sul de França, mas mais conhecido por ter escrito uma das  mais completas trilogias sobre a formação dos ninjas em Quioto , “Shiké”.
 
Falo também dos whiskies que para aqui trouxe há 35 anos e que por aqui se mantém. Hoje, por exemplo, abrimos um Chivas Regal com selo antigo de 1974 que está mais suave que mel de abelha…
 
Estamos a bebê-lo – obviamente – à saúde daqueles que há 40 anos deram um pontapé na “situação” e por acréscimo abriram mais uma (a última?) janela de oportunidade para as pessoas deste velho País.
 
A todos eles, sem excepção, mas pedindo licença para salientar Salgueiro Maia pelos motivos que todos conhecemos, o nosso muito obrigado!
 
25 de Abril Sempre!

quarta-feira, abril 23, 2014

Vou plantar as couves

Não pude ir de férias na Páscoa, pelas maleitas das "seniores" cá de baixo, transformadas em autênticas "santas de pau carunchoso" (pela idade, não pela ruindade... Enfim, não muito...).

Desta forma abalo para a "mais alta" logo pela manhã. Não garanto que vou mesmo regar, nem plantar as couves, embora o pé partido da minha "santa" lá de cima não  augure que este trabalho de Primavera esteja em bom caminho...

Como é que eu sei que está na altura de plantar as couves? Homessa! Então e o Borda de Água?! Ando sempre com ele no porta-luvas do carro!!

O almanaque do "velho da cartola"  é uma  glória nacional que devia ser condecorada no 10 de Junho.

Gerações de lavradores lusos  no tempo da ditadura só respeitavam a "santíssima trindade campestre": O Borda de Água Pai, o Diário Rural Filho e o Engº Sousa Veloso Espírito Santo (salvo seja e mal pareça!)

O "Borda de Água" é um autêntico Nostradamus dos tempos modernos!

Reparem bem na sua previsão para 2014:

"Para 2014 o almanaque anuncia um «ano vermelho»,  a culpa é de Mercúrio. O planeta que vai ter mais influência na Terra nos próximos 365 dias.

«Cada ano é acompanhado por um planeta e esse irá exercer sobre a Terra influências, a cor vermelha é a que mais se adequa à influência de Mercúrio, a sua simbologia é variada, dependendo daquilo que as pessoas mais valorizam».


Bem, para já o Benfica é o Campeão!! O resto logo se verá...

Até às próximas "Crónicas da Serra" - a fazer já neste fim de semana -  deixo convosco um dos aforismos do Borda, meu mestre na "Íngricola":

Inverno do Março e seca de Abril, deixam o lavrador a pedir."
"Abril, frio e molhado, enche o celeiro e farta o gado."

 

terça-feira, abril 22, 2014

Dia Mundial da Terra

A Terra é um bocado velha.  Pensa-se (rastreando meteoritos  por métodos radiométricos) que o planeta onde vivemos terá algo como 4,54 mil milhões de anos.
 (4,54 X 10 elevado à potência 9, o bilião americano que não se deve confundir com o bilião europeu que representa 10 elevado à potência 12).

Na escala cósmica 4,54 mil milhões não é assim uma "idade" muito impressionante. Talvez menos de metade da idade do Universo. Por isso podemos afirmar que, em termos humanos, a Terra terá agora entre 40 e 50 aninhos. Boa idade. Já por lá passei ... e gostei.

Mas divago.

Sempre vou dizendo que é normal admitirmos que as entidades com esta idade "média" são capazes de começar a desenvolver algumas  maleitas. O colesterol, a diabetes, alguma disfunçãozita nas articulações ( as artroses dos esforços de juventude) e coisas desse género.

Mas com a nossa Terra , e fruto da cambada de hóspedes indesejáveis que por lá pernoita, a situação ainda é pior. Muito pior.

Temos ultimamente dado cabo da cama onde nos deitamos, da mesa onde comemos e da cadeira onde descansamos. Somos piores do que a velha "marabunta" a destruir o que nos foi dado para cuidar.

Os nossos descendentes ficam já a apanhar bonés com as dívidas que lhes deixamos, fruto do que toda a gente diz ser uma "má gestão"  dos Governos.

Então o que dizer quando o assunto for aquilo que lhes deixaremos para viver? O solo, o mar, os rios, os lagos, as montanhas, tudo poluído e envenenado?

Eu, se fosse um desses jovens agora com 3 ou 4 anos, logo que me apercebesse do que me tinham deixado em testamento iria logo mijar para cima da campa dos cotas. Isto no caso de ainda poder mijar sem dor nessa altura...

Por isso, haja mais bom senso. Celebremos o Dia Mundial da Terra com actos e não apenas com belas frases e discursos arrebatadores.

A Assembleia Geral das Nações Unidas celebra  em 2014 o Dia Mundial da Terra-Mãe , com especial enfâse na questão da vida nas cidades e na necessidade de tornarmos as nossas cidades cada vez mais "verdes". Leiam aqui sff:

"Earth Day 2014 will focus on green cities, mobilizing a millions of people to create a sustainable, healthy environment by greening communities worldwide. Today, more than half of the world’s population lives in cities. As the urban population grows and the effects of climate change worsen, our cities have to evolve.
It’s time for us to invest in efficiency and renewable energy, rebuild our cities and towns, and begin to solve the climate crisis. Over the next two years, with a focus on Earth Day 2014, the Green Cities campaign will mobilize a global movement to accelerate this transition. Join us in calling for a new era of green cities.
Mother Earth is a common expression for the planet Earth in a number of countries and regions, which reflects the interdependence that exists among human beings, other living species and the planet. For instance, Bolivians call Mother Earth Pachamama and Nicaraguans refer to her as Tonantzin.
Recognizing that Mother Earth reflects the interdependence that exists among human beings, other living species and the planet we all inhabit, the General Assembly declared 22 April as International Mother Earth Day (A/RES/63/278)."

E eu não diria melhor.

segunda-feira, abril 21, 2014

La Vie en Rouge

A Crónica de uma Morte Anunciada , do grande Gabriel agora falecido, é um romance em que desde a 1ª linha da 1ª página ficamos todos a saber  da morte de um rapaz - Santiago Nasar - por supostamente ter desonrado Ângela Vicário, motivo pelo qual os irmãos da vítima o matarão.

Todo o livro é passado a tentar perceber porque mentiu a rapariga e quem é que ela está a proteger.

Este campeonato agora conquistado pelo SLB é um pouco assim. Desde há algum tempo - pelo menos 2 meses - que se sabia que os vermelhos prevaleceriam este ano. O ponto de interesse maior do Campeonato era saber  qual deles,  FCP  ou  SCP,   alcançaria o segundo posto.

A duas jornadas do fim tudo parece resolvido. O meu Estoril-Praia ficará em 4º lugar (ninguém acredita que o Porto perca  hoje), o FCP em 3º e o SCP - com todo o mérito - em 2º.

No caso (estranho mas possível ainda) do Estoril-Praia conquistar o 3º lugar acho que pela primeira vez na vida vou a banhos de mar antes de Maio começar. Não digo é onde, nem a que horas, nem quando. Para evitar imagens aterradoras no Facebook.

Mas voltando ao Campeão, trata-se -  e  a época  ainda não acabou - de um 2014 virado para o vermelho magenta.

Foi um Domingo em grande! A fome era muita e muito antiga, pelo que  a satisfação emergiu como a pororoca do Amazonas, em altura do equinócio.

Como lembrou um amigo meu, bem fez o António Costa que não quis mandar limpar o Marquês...

Só acho mal (menos bem) uma coisa: deviam ter tirado a malta da rua mais cedo por causa da próxima quinta feira. Sobretudo aqueles que vão para dentro do campo.

Mas ontem não era tempo para antecipar responsabilidades...

"Sabrons le champagne et laissons couler les mots".

quinta-feira, abril 17, 2014

Para Descansar a Vista...na Páscoa

Depois dos 40 dias da Quaresma (Quadragesima) vai amanhecer o Domingo de Páscoa, festa maior para várias religiões embora em diferentes contextos.

Neste ano não vou para a Serra . Obrigações familiares prendem-me cá em baixo, com  as minhas "santas"  a ficarem  cada vez mais velhinhas.

Mas espero que a semana seguinte, a do 25 de Abril (Sempre!), já me permita tomar o caminho das habituais "Crónicas da Serra", embora por menos dias.

Desejo uma santa Páscoa, uma muito boa Páscoa, uma Páscoa muito feliz (consoante as inclinações) a todos os leitores.

Para amenizar as cores mais sombrias do nosso quotidiano recordo com um poema  uma das  mais antigas invocações a um Deus único de que existe registo escrito.

Foi em 1400 antes de Cristo (mais ou menos) e o autor é o faraó maldito, Akénaton, marido da divina Nefertiti, o casal real que ousou converter o Antigo Egipto ao monoteísmo, pelo menos enquanto durou o sonho que foi Tel-el-Amarna:

Thou appearest beautifully on the horizon of heaven,
Thou living Aton, the beginning of life!
When thou art risen on the eastern horizon,
Thou hast filled every land with thy beauty.
Thou art gracious, great, glistening, and high over every land;

Thy rays encompass the lands to the limit of all that thou hast made:
As thou art Re, thou reachest to the end of them;
(Thou) subduest them (for) thy beloved son.
Though thou art far away, thy rays are on earth;
Though thou art in their faces, no one knows thy going.

 Fonte: Pritchard, James B., ed., The Ancient Near East – Volume 1: An Anthology of Texts and Pictures, Princeton, New Jersey: Princeton University Press, 1958, pp. 227-230.

E termino em português, com um poema de Sofia. E se Akenaton invocava o Sol, aqui neste poema Sofia fala-nos antes da  Lua:

Bebido O Luar

Bebido o luar, ébrios de horizontes,
Julgamos que viver era abraçar
O rumor dos pinhais, o azul dos montes
E todos os jardins verdes do mar.

Mas solitários somos e passamos,
Não são nossos os frutos nem as flores,
O céu e o mar apagam-se exteriores
E tornam-se os fantasmas que sonhamos.

Por que jardins que nós não colheremos,
Límpidos nas auroras a nascer,
Por que o céu e o mar se não seremos
Nunca os deuses capazes de os viver.

Sophia de Mello Breyner Andresen 

terça-feira, abril 15, 2014

A pobreza no Estado Novo

 Alguns leitores  gostariam de ler o artigo que Vasco Pulido Valente escreveu no Público, dedicado à "Pobreza no Estado Novo".

Com a devida vénia e  chapelada a meu mestre VPV, aqui vai, para esclarecer quem tem  as memórias mais fracas:

"O primeiro-ministro anunciou que Portugal não voltará tão cedo, se voltar, à relativa prosperidade de 2011. Outras personagens que o apoiam e o aprovam prevêem tranquilamente o empobrecimento progressivo do país. Nenhuma delas parece ter vivido os tempos de fome e desespero que duraram muito mais de 40 anos, durante a República, Salazar e Caetano.

Com 30 anos no “25 de Abril”, não me esqueci depressa do que era a vida nessa altura. Não falo da esquálida miséria do campo, que numa região rica a uns quilómetros de Lisboa, em que as pessoas trabalhavam o dia inteiro, envelheciam depressa e morriam de qualquer maneira, sem diagnóstico e sem assistência. Como não falo da província – do Minho ao Algarve – onde o horror se tinha tornado a normalidade. Na falta de uma experiência directa, seria um impudor.

Mas não me importo de falar da classe média (de resto privilegiada) em que nasci: e posso dizer que a pobreza contaminava tudo. O que se vestia, o que se comia, o que se fazia, o que se pensava. Mais do que na gente que mandava no Estado e no cidadão comum, a tirania estava, como dizia o outro, na necessidade de poupar, na privação perpétua da frivolidade e do prazer, no mundo imóvel e sem saída, que pouco a pouco se tornava numa prisão a céu aberto. As dores de crescimento num liceu de crianças caladas, que muito manifestamente esperavam o pior e, a seguir, numa Faculdade, que se destinava a premiar os filhos de família e a submissão, não levavam a uma descoberta ou sequer a uma aprendizagem, no seu melhor levavam a uma espécie de punição que moía e predispunha à desistência e ao cansaço.

O Portugal de hoje não conseguiria nunca perceber o Portugal de 1950 ou de 1960. Agora, até se glorifica o crescimento da economia e a estabilidade financeira do regime. O primeiro-ministro com certeza nunca se deu ao trabalho de imaginar aquilo a que a pobreza haveria condenado um rapazinho de Trás-os-Montes com uma mediana boa voz. Nem lhe descreveram o deserto que foi Lisboa nessa época de chumbo, onde ir ao café ou a um cinema de “reposição” tomavam as proporções de um acontecimento. Os sinais que o país começa a voltar atrás são claros. Verdade que a civilização que entretanto se criou não vai desaparecer. Mas nada disso consola se imitações substituírem o que existia antes e acabarmos na mediocridade e na tristeza de uma simples sobrevivência sem destino."

 E Olé!!

Ir às Hortas para Odivelas

Hoje haverá uma cerimónia na Câmara Municipal de Odivelas, comemorando o 25 de Abril. E eu lá estarei com a minha habitual "caixa" dos carimbos em prata, exibindo um carimbo que será colocado em cima da série de selos do "25 de Abril - 40 Anos" e com vários exemplares do livro homónimo que o Prof. Costa Pinto escreveu para nós.

Que maravilha podermos celebrar este dia! Para quem ainda desmerece das conquistas de Abril nada como reler o excelente artigo de Vasco Pulido Valente sobre a "pobreza do Estado Novo" escrito no "Público".

Há 40 anos o que era Odivelas? E no dealbar do Estado Novo? E antes disso?

Raul Proença  (em 1924) estigmatizava de forma violenta os habitantes dos "arrabaldes" de Lisboa:

"Quando Afonso Henriques tomou posse de Lisboa, consentiu-se ao mouro que refluísse para os subúrbios da cidade, e ele aí se estabeleceu, entregue ao cultivo das hortas, com a água a escorrer da nora generosa. É desta população consentida, mourisca e subalterna, que deriva o mais da gente que habita os contornos de Lisboa - o Saloio de tez morena, olhos e cabelos negros e castanhos, pele tisnada, membros secos, tipo sem finura de raças ou beleza plástica de linhas..."

Esqueceu-se foi de acrescentar que era essa "gente" sem finura de traços que alimentava Lisboa, que dava de comer aos "outros" belos e robustos do Norte, se calhar demasiado altos para se curvarem sobre a enxada.

Odivelas (com Loures, Amadora\Porcalhota, Sintra e Mafra à mistura) era há muitas dezenas de anos atrás uma zona de belas quintas rurais, onde para além dos lavradores e seus apêndices, existiam as antigas profissões da "lavadeira", "almocreve", "moleiro" e o inevitável "carroceiro", do qual se contavam anedotas mil.

Toda esta gente se encontrava às Portas de Benfica , local onde se efectuava a pesagem dos produtos que entravam na cidade.

(Atenção que não era às Portas de Alvalade! Nessa altura Alvalade era um couto - Quinta das Mouras -  do Sr. Visconde do mesmo nome).

O Instituto Feminino de Educação e Trabalho (protótipo do Instituto de Odivelas) foi ali fundado em 1900, e logo 12 anos depois era lá professora a grande Adelaide Cabete, médica e escritora, uma das mais importantes figuras femininas do século XX em Portugal.

Mas antes, muito antes disto tudo, Odivelas era terra arável, água e hortas.

 Odivelas é também o local de repouso do grande Rei D. Dinis, o rei iniciado. 

Dizem que a D. Dinis e aos seus hábitos lascivos se deve o nome da Vila. Parece que visitava ali muitas jovens do seu agrado, pela noitinha. A Rainha Santa  Isabel  uma vez  fez-lhe uma espera com as suas damas e gritou-lhe  "Ide vê-las Senhor, Ide vê-las!"

Feliz teria D. Dinis sido naquele lugar, porque ali quis ser enterrado.

No seu repouso terreno -  o Mosteiro de S. Dinis e S. Bernardo de Odivelas - as Madres sempre trabalharam bem nos fornos e nas panelas, tendo ali ao pé avultado fornecimento de ovos, e dádivas generosas de açucar:

"O Convento de Odivelas foi, sem dúvida, um dos que mais contribuiu para a doçaria de Portugal.
As suas especialidades em confeitaria e doçaria, fabricadas pelas freiras bernardas fizeram tradição. Destacam-se a célebre Marmelada de Odivelas, os Suspiros de Amêndoa, asRaivas, os Tabefes, os Esquecidos, o Toucinho do céu, entre outros."
Lembremo-nos a terminar da Madre Paula, famosa amiga especial de D. João V, que muitos favores alcançou para o Mosteiro.
Odivelas é terra boa, terra de prazeres terrenos e de gastronomia antiga. Vou gostar muito de ali celebrar o 25 de Abril 40 anos depois. Até porque foi ali - Quartel da Pontinha - que se baseou o Posto de Comando do MFA. 

segunda-feira, abril 14, 2014

Espreitar a vida alheia, lucro ou prazer?

O fenómeno conhecido em literatura como "voyeurism" é definido no Oxford Dictionary como:
A person who gains sexual pleasure from watching others when they are naked or engaged in sexual activity.

A simples cusquice que não implica necessariamente nem nudez , nem truca-truca, aquilo que os anglo-saxões chamam "creeping",  é muitas vezes considerada como "espionagem" em bom português, mesmo que os segredos "do outro" nada tenham a ver com submarinos nucleares ou margens de rentabilidade de produtos apetecíveis.

Existem muitos locais na net que ensinam os truques que o "candidato a espião" deve utilizar. Alguns deles, como este:
http://lifehacker.com/5952171/the-best-ways-to-invade-someones-privacy
são relativamente inofensivos e até começam por explicar que se trata de práticas ilegais e sem dúvida não éticas. Outros são  muito mais agressivos.

Mas o hacker profissional que se transforma em "creeper" ou que vende os seus segredos a outros "creepers", sabe muito mais do que está escrito nestes artigos.

O motivo que as pesquisas  dão como sendo o mais frequente para justificar esta invasão da vida alheia por particulares é conhecido desde o início do mundo, desde aquela altura em que Caim e Abel começaram a "marrar" um com o outro: o velhíssimo ciúme.

Homens e mulheres ( e advogados de uns e de outros, e detectives privados a soldo de uns e de outros) a querer saber onde foi que a "cara metade" passou a tarde,  com quem foi na viagem de negócios, para quem telefona, a quem envia mails.

Depois do ciúme, existem como mais frequentes justificações para o creeping\espionagem as que envolvem a espionagem industrial ou comercial, as preocupações dos pais para saber por onde andam os filhos, e as preocupações dos empregadores para controlar o que fazem e onde estão os empregados, sobretudo a chamada "força de vendas".

Lá para o fim disto tudo aparecem na estatística os verdadeiros "James Bond", os espiões herdeiros da honrada tradição da guerra fria.  A espionagem pura e dura de Estado .

Estas aplicações "profissionais da cusquice" aparecem em último lugar porventura porque os verdadeiros espiões sabem o que fazem  e os mais bem sucedidos não são detectados e continuam a espiar sem que ninguém dê por eles.

Se estão a pensar na NSA são capazes de ter razão... Bom Dia Edward Snowden.

Uma das histórias mais engraçadas desse período da guerra fria , dos anos 50, foi a daquele diplomata sueco com quem alguém (um novato soviético)  tentou fazer chantagem com várias fotografias dele num quarto de hotel com uma companhia que não era a "legítima". E ambos nus e em acção.

O diplomata olhou, sorriu e disse para o cinzento funcionário que lhe apresentara o dossier fotográfico:
-"Olhe, gostei muito! Seria possível arranjar-me umas ampliações desta e daquela fotografia para enviar à minha mulher? Ela devia adorar!"

Espia-se para quê?  Nos casos que não são doentios (e incluo aqui a grande maioria do ciúme, bem assim como a "auto-gratificação" do triste doido que espia apenas para gozo próprio ) espia-se normalmente para encontrar alguma coisa que permita fazer pressão sobre o visado.

Nos dias de hoje, quando  as inclinações sexuais de cada um têm cada vez menos importância social, uma das melhores formas de "aplicar pressão" sobre o "alvo" parece que é a evasão fiscal... Imaginem: o IRS, o IRC e as outras obrigações legais, como a falta de pagamentos para a Segurança Social.

Nos países do sul, onde historicamente uma pessoa que não paga impostos é "um esperto" e o que paga é "um nabo", tenho algumas dúvidas sobre o opróbio social destas denúncias públicas. É claro que se a denúncia for à Repartição de Finanças, é capaz de haver mais chatices.

Mas nada que se compare ao "cacau" que daria se a mesma denúncia fosse feita nos USA...

Há até toda uma jurispridência norte-americana feita em volta desta  aparente contradição:
"Se a chantagem em si já é crime, será aceitável fazê-la para não denunciar outro crime? Por exemplo, exigir a alguém um contrato vantajoso  para  não denunciar que esse visado cometeu um crime fiscal"

Leiam aqui sff uma análise do tema:
http://law.jrank.org/pages/569/Blackmail-Extortion-paradox-blackmail.html

Tendo em atenção a história recente dos administradores do BCP, a única coisa que devo aconselhar a quem se queira meter nestas (ou noutras)  jogadas ilegais onde sejam alvo de denúncias,  é que tenham dinheiro.

Sendo ricos podem esperar pela passagem das ondas sem problemas. Meses e meses, anos e anos, até à Prescrição...

Perante a Justiça todos os Homens são iguais. Mas...sempre houve  homens que eram mais iguais do que outros. Desde o tempo do Adão. Quanto mais hoje, que há Internet...

sexta-feira, abril 11, 2014

Para Descansar a Vista...Em Abril

Numa entrevista que Manuel Alegre deu ontem à TSF ouvi a história estranha do seu poema "Lisboa  Perto e Longe", escrito em 1967, e onde uma das estrofes parece falar já do 25 de Abril.

O poeta não sabe explicar esta coincidência. Sendo agnóstico deve achar tudo isto muito curioso mas apenas isso. Uma daquelas coincidências que surgem de vez em quando...

Não sei se neste caso concreto não será para alguém mais crente no "oculto" ver aqui um daqueles buracos no "espaço-tempo" por onde é possível vislumbrar o futuro.
O que obviamente só se confirma depois do acontecimento "adivinhado" se concretizar.

Porque até essa altura nem o visionário "avant la lettre" nem o seu leitor sonhariam que estavam a ver o futuro dali a 7 anos,  "plasmado" num poema.

Por mim, sempre que me deparo com estas coisas  utilizo o conhecido aforismo   da cultura popular espanhola,  mais vulgarizado por Miguel de Unamuno:

"Yo no creo en brujas, pero que las hay, las hay".

O meu sogro para exorcisar o temor do desconhecido, e preocupado com maus olhados , crendices e feitiços, sempre dizia:

- "Pata de coelho na mala do carro, ferradura de mula atrás da porta , corno de carneiro na gaveta das peúgas".

E acrescentava que "cautelas e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém".

Por acaso já morreu (como acontece a todos). Mas enquanto foi vivo acreditava piamente nestas práticas como "profilaxias da desgraça".

Nem serei eu que pensarei mal de algum dos leitores se tomar estas precauções também.

Lá vai então o poema em causa:

Lisboa perto e longe

Lisboa chora dentro de Lisboa
Lisboa tem palácios sentinelas.
E fecham-se janelas quando voa
nas praças de Lisboa -- branca e rota
a blusa de seu povo -- essa gaivota.

 Lisboa tem casernas catedrais
museus cadeias donos muito velhos
palavras de joelhos tribunais.
Parada sobre o cais olhando as águas
Lisboa é triste assim cheia de mágoas.

 Lisboa tem o sol crucificado
nas armas que em Lisboa estão voltadas
contra as mãos desarmadas -- povo armado
de vento revoltado violas astros
-- meu povo que ninguém verá de rastos.

 Lisboa tem o Tejo tem veleiros
e dentro das prisões tem velas rios
dentro das mãos navios prisioneiros
ai olhos marinheiros -- mar aberto
-- com Lisboa tão longe em Lisboa tão perto.

 Lisboa é uma palavra dolorosa
Lisboa são seis letras proibidas
seis gaivotas feridas rosa a rosa
Lisboa a desditosa desfolhada
palavra por palavra espada a espada.

 Lisboa tem um cravo em cada mão
tem camisas que abril desabotoa
mas em maio Lisboa é uma canção
onde há versos que são cravos vermelhos
Lisboa que ninguem verá de joelhos.

 Lisboa a desditosa a violada
a exilada dentro de Lisboa.
E há um braço que voa há uma espada.
E há uma madrugada azul e triste
Lisboa que não morre e que resiste.

  Manuel Alegre
 

 

quinta-feira, abril 10, 2014

O Tempo

Desta vez não me vou queixar do S. Pedro (que parece ter ido já recauchutar as orelhas, de tanto ardor que tinham) mas sim de alguém ainda mais antigo. Muito mais antigo por acaso,

O velho Cronos, titã da mitologia grega que tinha o mau hábito de comer os filhos assim que estes nasciam. Comer mesmo! Não era "comer à moderna"! Digamos que para um Pai ambas as coisas são condenáveis, mas a que envolve mastigação será muito pior. Sobre o assunto diz-nos a Wiki:

Esta representação deve-se ao facto de os antigos gregos tomarem Chronos como o criador do tempo, logo, de tudo o que existe e pode findar, sendo que, por este facto, se consideravam como filhos do tempo (Chronos), e uma vez que é impossível fugir ao tempo, todos seriam mais cedo ou mais tarde vencidos (devorados) por ele.

Pois o que me parece estar agora a acontecer é que começa a faltar-me o tempo. As horas e os minutos. Não no sentido da morte a esperar!! Nada disso. Essa quando vier que venha, estarei pronto para nova aventura! Sou optimista  todos os dias!

Apenas acho que me falta o tempo para as coisas do dia-a-dia. Cada vez mais a filatelia é objecto do interesse da sociedade civil. Cada vez mais há que sair para fora do nosso umbigo, explicar as entrelinhas deste velho negócio, combinar apresentações e lançamentos, falar de Postais Inteiros e de carimbos comemorativos.

E, por outro lado, as minhas idosas  -  as "santas" como lhes chamo - estão cada vez mais frágeis e a precisar de acompanhamento. E como o "Je" é viúvo e filho único, para cima dele caem as obrigações.

A santa lá de cima andou semana e  meia com um pé partido porque se recusava a ir ao médico e ao hospital, com medo que a engessassem e não pudesse "acomodar o vivo".  Tratar das galinhas, patos, coelhos e mais bicharada. Imaginam se isto ainda pode acontecer no Portugal de hoje??!! Pois eu também não imaginava...

As duas cá de baixo andam agora à volta com as gripes. E todo o cuidado é pouco para evitar complicações de pulmões. Que já começaram.

Com um olho no burro e outro no ladrão (o politicamente correcto malta!!) por cá vou vivendo.

Valem algumas coisas boas da vida: o magnífico cozido à portuguesa em casa do amigo Álvaro de Sábado passado (mais um de cair para o lado, só com produtos do chamado Pinhal Interior Sul, que agrupa Oleiros, Vila de Rei, Sertã e Proença-a-Nova ); a volta ao pequeno écran dos Da Vinci Demon's e War of Thrones;

E sobretudo o magnífico livro de poemas de Manuel Alegre ontem apresentado no Quartel do Carmo, País de Abril, posto à venda pela D. Quixote a preço de saldo para que se esgote. E bem merece!!

Até amanhã e aproveitem bem o Tempo!  Tal como a Terra, este também já não se fabrica...

terça-feira, abril 08, 2014

Pequenos prazeres que custam pouco, ou nada...

O nosso amigo  Américo, com a sua crónica sobre o "banco público" que consta ontem dos comentários, lembrou-me que muitas coisas boas da vida não custam ...dinheiro. Podem é custar outras coisas.

O "banco público" é genial. Não é obviamente a Caixa Geral de Depósitos!! Nem sequer o Banco Público para Células Estaminais, ou o Banco Público de Sangue! Trata-se sim do banquinho de madeira ou de ferro que os poderes públicos, as autarquias benévolas, pôem à disposição dos transeuntes para conforto dos reais assentos de quem passa.

Sendo o nosso mundo o que é, obviamente que houve já alguém que complicou uma ideia maravilhosamente simples.  Vejam lá isto:
Como tradicionalmente os bancos de praças públicas reúnem pessoas para uma boa conversa,  a Fisherman’s Friend criou o “Banco da Amizade”, que não permite que alguém se sente sozinho sobre ele. O banco possui um eixo central por onde se equilibra todo o peso. Dessa maneira é necessário se ter no mínimo duas pessoas sentadas para que ele não caia para um dos lados.

Mas que ideia do car****.  (do caraças, ordinários!)

Outra ideia de uma coisa boa sem custos é um beijo.  Um beijo é sempre bom e pode até ser muuuito bom. Teoricamente não terá custos. Na prática...pode sair mais caro que um carro de gama alta. Mas isso é estar já a desconversar.

Quanto custa um sorriso? E não é bom andar por aí a sorrir, distribuindo boa disposição ?

Neste caso dos sorrisos e deixando de lado as razões que se prendem com o "karma" de cada qual, até parece que a sorrir vão as pessoas ganhando . Envelhecem menos e gastam menos músculos da cara do que se andassem mascarados de elefantes.

Finalmente, uma coisa muito boa e importante, relativamente barata (para não dizer gratuita) e frequentemente desvalorizada: o silêncio!!

O sossego do silêncio durante a noite, o silêncio que permite  "ouvir" a Natureza, o silêncio que acalma e traz a paz. O silêncio intercalar sem o qual não existe a pausa que permite apreciar a boa música.

Em casa de homens ( que é o que se passa comigo) o silêncio é muitas vezes rei e senhor. Quando chega a "santa" lá às "premissas" parece que se abriu a torneira do som à radio da Feira da Ladra.
Nem sonham o volume da cacafonia! A "santa" começa a estar tão surda como o Penedo da Saudade, o que a leva a puxar pelos decibéis tal e qual como se fosse o Abrunhosa no Pavilhão Atlântico... De fugir de uma e do outro (digo eu).

Mas quando parte a idosa senhora, o silêncio que se cria por  bendita antinomia sabe quase tão bem como chegar a casa e beber uma cerveja bem fresca depois de duas horas na fila  à saída da Praia da Comporta nalguma tarde de Agosto...

E, já agora que penso em praia, coçar as partes também não custa nada e sabe bem que se farta. Mesmo dentro do mar, onde estamos mais à vontade.

Ponham lá na lista sff.

segunda-feira, abril 07, 2014

Para a beira mar Malta!

O problema é que é Segunda Feira... O tempo está bom e recomenda-se. O solzinho apareceu e as temperaturas vão para cima dos 22 graus.

Mas é Segunda Feira.

Nas Segundas Feiras vão passear os pensionistas e reformados que ainda podem, vão passear as criancinhas se as levarem, podem ir passear os desempregados, se encontrarem ânimo para tal. Mas quem trabalha ( e muito obrigado por isso!) não pode.

Nos finais das tardes -  e agora que mudou a hora é de dia quase até às 20h -  apetece mais "desopilar".

O preço que se paga por uma qualquer bebida nas esplanadas à beira mar já se torna disuassor dessa simples aventura?

Depende... Das esplanadas e do bolso de cada um. Mas não deixa de ser sintomático que se contem hoje os euritos para uma vodka tonica de fim de tarde. Ou para uma Sangria de Espumante...

A antecipação de um copo ao  pôr do sol em boa companhia (pode ser o cão, mas de preferência seria outra coisa) é sempre sinal que a primavera anda no ar.

Os amigos gauleses costumavam dizer "Couture et peinture sont les occupations de Printemps".

Eu não sei coser ( sei mais ou menos cozer, o que não é a mesma coisa) e muito menos pintar, embora tente dar trabalho a alguns pintores.

Por isso, aqui vai copo. Ou, melhor dito, jarro.

Experimentei com o meu senhorio esta sangria e aqui a deixo para vossa crítica depois de experimentarem. É muito mais barata fazê-la e bebê-la em casa do que em frente ao Tejo, numa das esplanadas da moda... Mas não é a mesma coisa!

  • 1 garrafa de espumante rosé Loridos (por ex)
  • 150g de frutos silvestres (podem ser dos congelados)
  • Morangos q.b.
  • 2 paus de canela
  • 4 colheres de sopa de açúcar mascavado
  • 50 ml de vodka
  • cerca de 1 litro de 7up Limão
  • umas folhas de hortelã pimenta frescas
  • Gelo q.b. 
Num jarro coloque os frutos silvestres, o açúcar e a vodka. Em baixo umas folhas de hortelã.
Mexa. Junte os paus de canela e a garrafa de espumante. Acabe de encher o jarro com a bebida gaseificada e o gelo.  Decore com os morangos e mais algumas folhas de hortelã.  Bebam!

sexta-feira, abril 04, 2014

Para descansar a Vista...Em Restaurações e Libertações

Hoje de manhã , à saída da Versailles, reparei numa carrinha de caixa aberta,  já idosa, que trazia pendurado na porta traseira (de acesso à carga) o letreiro: "Fazem-se Restaurações".

Pensei logo que se tratava de algum descendente dos "conjurados de 1640", o qual teria caído em desgraça por causa da crise económica , tendo por causa disso decidido oferecer publicamente os seus serviços de "restaurador" à pátria, ou a quem mais o necessitasse.

Podia também ser uma manobra publicitária do Sr. Vice-Primeiro Ministro Paulo Portas, já inebriado com a iminente "restauração" da nossa soberania, nós que estaríamos (segundo ele)  sob um regime de protectorado.

A ideia mais prosaica era evidentemente estarmos na presença de um profissional da construção civil, que seria perito em "restaurar" casas e apartamentos, fachadas e chãos de cozinha, portas e janelas. Muito capaz de instalar na perfeição alguma "marquise", acessório que já foi tão de moda lá para os lados de Belém.

 Eu teria algumas dúvidas, porém, em adjudicar-lhe algum trabalho.

 Isto porque a carrinha em causa exibia orgulhosamente na janela traseira um cachecol do Sporting Clube de Portugal onde se lia: "Sporting Campeão Nacional 2001\2002".

O problema nem era a simpatia clubística (nessas coisas sou um liberal) mas sim a idade provecta do artefacto, tão desbotado do sol e do tempo que já nem se via a corzinha... Imaginem a idade do "operário"...

Deixemos estes detalhes e passemos à poesia. Para rimar com "Restauração" de uma forma que não seja nem imediata, nem Pimba (o inefável "coração" vem à memória imediatamente) sugiro que se glose hoje - 4 de Abril - mês da Liberdade,  outra palavra : "Libertação".

Do poeta angolano Antero Alberto de Abreu (Luanda, 1927) aqui vos deixo um soneto:

Libertação

Das mentiras loucas que me envolvem
Vou quebrando os liames um a um
E da angústia da libertação
Nascerá um dia a paz
Do ser e do não ser.


Das mentiras vãs que me amordaçam
Os véus arrancarei a um e um
Tristes despojos dum passado velho
Que em mim se quis perpetuar.


E deixarei um rasto de desilusões;
Um caminho de lágrimas choradas;
Um pouco do que fui em cada dia.


Mas ficarei seguro e afirmado,
Com a serenidade dum Buda na floresta,
Com a nudez dum Cristo no redil.


Antero Alberto de Abreu - Permanência  -  Lisboa, Edições 70

quinta-feira, abril 03, 2014

O Joel em Peniche

Peniche tem recordações muito ligadas à mitologia do 25 de Abril. Para o seu Forte eram recolhidos os "opositores ao regime". No seu Forte teve lugar uma das mais conhecidas fugas de presos de que há memória em Portugal, protagonizada por Álvaro Cunhal, em 3 de Janeiro de 1960.

Aqui ficam os nomes dos heróis dessa fuga, para memória futura:
Álvaro Cunhal, Joaquim Gomes, Carlos Costa, Jaime Serra, Francisco Miguel, José Carlos, Guilherme Carvalho, Pedro Soares, Rogério de Carvalho e Francisco Martins Rodrigues.

Foi Rogério Paulo (o actor de teatro) que deu o sinal para a fuga. E na primeira noite de liberdade Álvaro Cunhal veio dormir para S. João do Estoril, na casa de Pires Jorge, onde acabou por viver ainda algum tempo na clandestinidade.

Nestes tempos algo conturbados e esquecidos faz bem recordar estas histórias.

Mas Peniche é também lugar de bem comer. Famoso pelas suas lagostas, pargos e cardeais, percebes das Berlengas e por tantas outras maravilhas da nossa gastronomia marítima.

Em Peniche existe a Tasca do Joel. Numa rua antiga com o improvável nome de Rua do Lapadusso. nº 73.

Para lá ir ter sem GPS o melhor é tentarem dar com o cemitério (cruzes , canhoto!) e após essa plantação de tabuletas virarem à direita (para quem vem do cabo) ou à esquerda, para quem vem do forte. E perguntem.

Tasca do Joel
Rua do Lapadusso 73
 2520 370 PENICHE

Telefone: 262782945

Na Tasca do Joel existe uma sábia coordenação a que poderemos chamar  o "dois em um". Há uma loja gourmet para vinhos, charutos, petiscos e destilados. Há um restaurante onde podem ser provados logo a seguir os produtos comprados na Loja, sem aumento de preço!

Que grande ideia!

A minha recomendação é que cheguem cedo, vão para a loja, escolham o vinho do almoço (vão cedo para permitir ao branco refrescar). Paguem o vinho. Depois sentem-se e "mandem vir". Não sem antes passarem obrigatoriamente pela montra do peixe fresco!

No Joel deve comer-se aquilo que o mar deixou apanhar no dia a dia (encerra segundas feiras e domingos à noite).  Mas a sua oferta "fixa" é mais ou menos esta:

Entradas: Pataniscas da Tasca; Salada de ovas;Presunto Maldonado; Chouriço assado; Morcela de arroz;
Peixe: Bacalhau à lagareiro; Lulas grelhadas; Espetada de lulas; Bacalhau à tasca; bacalhau à joel; Bacalhau com puré. Peixes frescos do dia.
Carne: Alheiras à tasca; Franguinho à tasca; Lombinhos de porco preto; Secretos de porco preto; Bife à lapa do urso; Javali à tasca com castanhas; Codornizes; Espetadas de porco; Espetadas de perú; Entremeada.
Doces: Pudim de pão; Pudim de ovos caseiros; Pastéis típicos da tasca; Doce de manga.

Dois Mânfios ali aportaram num destes fds. Comeram presunto Maldonado, chouriço assado de Garvão, lulas grelhadas simples . E depois um Cardeal soberbo assado no forno com legumes e batatas novas salteadas.
Nota: Cardeal é um peixe vermelho de carne  firme e branca,  muito próximo do que chamamos em Cascais "Imperador".

Antes tínhamos passado pela Loja e mercou-se uma garrafa dos Projectos Dirk Nieepoort, um Tinto Cão de 2009. Foi este tinto raro , leve e seco, que fez boa companhia ao Cardeal. As entradas foram acompanhadas por dois copos de branco Quinta de Saes Reserva (belo serviço de vinho a copo!).

Um Terrincho velho serviu de sobremesa, terminando-se com Balvenie malte de 12 anos. E fez-se esta festa toda por pouco mais de 80€.

Não gostei apenas de duas coisas: têm o queijo frigorificado. E o peixe, se não avisarmos antes, é escalado antes de posto ao lume... Mas como estou aqui a avisar, qualquer destas coisas é  facilmente ultrapassável com uma pequena conversa antes de nos sentarmos:

-" Amigo, sff tire o queijo de frio e por favor asse (ou grelhe) o peixinho inteiro, como Deus Nosso Senhor o fez".

E pronto!

Aproveitando a viagem aviou-se ainda uns vinhitos mais, que beberemos em honra e memória dos fugitivos de 1960!

terça-feira, abril 01, 2014

Mentiras

Depois de uma segunda feira atribulada com mais médicos e clínicas (onde se veio a provar que,de saúde geral, a "santa" cá de baixo está melhor do que eu e do que o médico dela...) chegámos ao 1º de Abril.

Excepto quanto à sua génese em França, não se entendem os peritos quanto ao acontecimento que esteve na origem deste dia, mas toma algum corpo a ideia que teria sido alguma alteração no calendário havida em França por volta de 1550 que deu origem à tradição. Há também quem diga que o 1º de Abril era dia de proibição de pesca em França, pelo que se tornou costume oferecer por chacota aos pescadores em terra um arenque fumado nesse dia. O "poisson d'Avril" , a mentirinha graciosa que se prega a amigos e familiares terá assim começado.

Agora por França, o nosso amigo François Hollande suponho que estará neste momento desejando que os resultados das eleições locais tivessem sido uma mentira de Abril antecipada, mas isso é outra história!

Neste dia ofereço aos meus amigos e leitores um conjunto de mentirinhas de Abril para escolherem:

- Académica, Braga, Vitória de Guimarães, Tondela, Estoril, FC Porto e Belenenses acabam por formalizar a constituição de uma segunda Liga de Clubes, que organizará os campeonatos de acordo com a regulamentação vigente. FCP e Estoril-Praia terão assim acesso imediato à Champions.

- Pedro Passos Coelho e António José Seguro foram vistos a sair da Horta dos Brunos ontem à noite. Em consequência Paulo Portas convoca Conferência de Imprensa para hoje. Receia-se mais uma irrevogável  demissão.

- Os CTT Correios de Portugal adquirem posição dominante na Tabaqueira.  Admite-se que a iminente legalização do consumo de marijuana em Portugal poderá explicar esta operação.


- BCP solicitou ao BP a passagem a Casa de Câmbios.

- Foi descoberta a famosa cave escondida do BPN. Luis Mira Amaral, agastado com a divulgação da notícia, não confirma nem desmente que se teria lá encontrado a múmia de Alves dos Reis em sarcófago importado da antiga União Soviética.

- USA e Federação Russa chegam finalmente a acordo sobre a Crimeia: Putin compromete-se a libertar a Crimeia quando Barak Obama entregar o Alaska aos russos. Acordo foi selado com sorridente aperto de mão.

- BE pede integração em bloco  no PCP. Jerónimo de Sousa não aceita esta solicitação incondicionalmente e pretende escolher os militantes, um a um. "Há lá garinas que vale a pena entrevistar",  terá dito o patriarca...

- Miguel Relvas apresenta a sua candidatura a Secretário Geral da Academia Portuguesa de História. Segundo ouviu dizer, "é mais fácil branquear a história estando lá mesmo ao lado da máquina de lavar"