quarta-feira, agosto 05, 2015

Invejas


Tenho inveja de muito poucas coisas e quase de ninguém. Nunca fui abastado ( a não ser de apetites) e nunca o virei a ser. Também nunca me faltou o suficiente para viver bem. E talvez seja nessa definição de "viver bem" que deve estar a grande , a maior parte, da infelicidade dos outros que se sentem com "invejas".

É evidente que o meu "viver bem" não deve ter os mesmos limites do "viver bem" do Sr. Jorge Mendes ou de algum dos seus amigos mais influentes...

Iates, aviões privados  e propriedades de milhares de hectares rodeadas por muros altos, com cavalos de raça e tapadas de caça particulares, onde  as mais belas mulheres ( e homens! Deve haver para todos os gostos) do mundo são convidadas para passar largas temporadas?

Isso não é a minha praia, embora deva dizer ( se houver por aí alguém compatível com essas grandezas que me queira adoptar) que facilmente me adapto a novas situações e estou em crer que não me iria custar muito adaptar-me a essa...

Todavia a realidade de quase todos não é assim. Temos as nossas vidinhas, com mais ou menos cinema, com mais ou menos caldeirada, com mais ou menos dias de férias fora do ambiente natural. E a maior sabedoria que podemos exercer na vida é  saber ser feliz com o que podemos ter .

Nisso sou (passe a imodéstia) perito.  Tanto me "passo" com uns lagostins acabados de apanhar, cozidos ao momento e logo esfriados em gelo e água, como com umas petingas fritas com arroz "macho" (de tomate, para quem não sabe. O "fêmea" é o de grelos).

Há um limite para estas felicidades do pequeno burguês? Sim. Claro que há. Caso contrário a pílula do contentamento súbito não se teria inventado. E nunca existiria a  mobilidade social -  termo hoje muito utilizado como politicamente correcto, mas que, na prática, não é mais do que a "revisitação" da velha luta de classes do século XIX e XX.

Retomando a analogia gastronómica, felizes com sardinha ou lagostim, desde que ambos frescos e bem feitos. Felizes com Barca Velha de 2000 ou com  um honesto vinho do ano de Alpiarça (Lagoalva).

Não havendo nada no prato, perante um papo seco  mal barrado com Flora? Acabou-se logo ali o desejado "contentamento". Isto para não estar a falar de misérias ainda maiores e que, infelizmente, existem ao pé de nós embora haja quem sobre elas exerça uma certa miopia dedicada.

Algumas das minhas invejas mais "primárias" têm a ver com percalços da vida a que fui sujeito, como somos todos, de uma forma ou de outra.  Todos perdemos alguém que nos faz falta, e em quem pensamos todos os dias do ano.

Outras são mais complexas, são "de conjuntura":

Por exemplo, não ver no nosso país a capacidade para integrar todos os bons estudiosos , já doutorados e a caminho, em centros de investigação capazes e modernos, de forma a poderem contribuir para o progresso científico. Ou ainda, não encontrar desenvolvimento industrial sustentado que retire o anátema "País de Serviços" a esta velha nação. Ou até, observar a degradação do serviço público, em várias áreas fundamentais para garantir o bem estar dos cidadãos.

Nessas coisas não me envergonho de dizer que  tenho inveja dos Estados Unidos da América (em relação aos estudos superiores e programas de doutoramento e pós-doutorais), da Noruega e outros irmãos escandinavos...
As outras "invejazinhas" são pueris, para não dizer  birras infantis. Têm a ver com aquelas vontades momentâneas que assolam todos nós ( os MACIV's - Machos Civilizados) de ter o último MacBook Pro Retina, arvorar o IWC boutique ingenieur no pulso, ter em casa o Beamer M6 Convertible para sair ao fds.

E se me vejo afligido por alguma, o remédio (que recomendo a todos ) é logo ir ver um documentário da ACNUR ( Agência da ONU para os refugiados) para imediatamente ficar ciente das proporções.

Remédio santo!

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