domingo, junho 20, 2010

Morreu o Velho Infiel

Dizem que Isabel a Católica, depois do trágico e mal explicado acontecimento da morte do Píncipe Perfeito, teria dito a seu marido Fernando:

 " - Morrió El Hombre..."

E mais nada era preciso para ilustrar o assunto. El Hombre era aquele, D. João II, não havia outro mortal que se lhe pudesse comparar no sentido profundo que a grande rainha dava à palavra, para o bem e para o mal.

José Saramago morreu em Lazaratote na Sexta Feira passada e hoje traçam-se na Câmara de Lisboa os usuais discursos de circunstância, de pesar e de louvor póstumo. A Igreja Católica provincianamente (segundo alguns) ou não desejando fazer de hipócrita fúnebre (de acordo com a opinião de outros) publicou artigo um pouco estranho no Osservatore Romano, a modos que preparando a alma do velho infiel para o seu encontro aprazado com Belzebu. Conhecendo pouco a criatura Saramago não sei o que este diria da "boutade", mas quase que aposto que se riria com gosto.

Li 3 livros dele: "Todos os Nomes " do qual não gostei. "Memorial do Convento" que apreciei muito;  e finalmente "A Jangada de Pedra" do qual tenho de confessar que também gostei, mas sem "adorar"... Comprei ainda outro,  a história do Elefante Salomão na sua peregrinação de Lisboa a Roma, mas começei a lê-lo e ainda não tive a coragem de o acabar...Está à cabeceira, metido entre o "American Gods" de Neil Gayman e o último de Terry Pratchet , "Monstruous Regiment"... Pode ser que com esta morte me venha a vontade de lhe pegar outra vez. Tenho a certeza disso, embora, e como já compreenderam, não seja fanático da sua forma de escrever...

"El Hombre português nobelizado y comunista de periodico", vivia em S. José de Lazarote e não foi muito bem tratado pelo seu País. Mas há quem diga que também ele não o tratou muito bem. Histórias antigas do pós 25 de Abril...

É possível. Dizem de  Beethoven que tinha um feitio de filho da p*** tão grande que ninguém o podia aturar, e isto mesmo antes de ter ensurdecido. E abundam também os relatos de como era impossível confraternizar com Richard Wagner... E quanto a arrobos de defesa da pátria, não foi Leão Tolstoi perseguido até ao final da vida, até aos confins da Sibéria, pelos mesmos "ortodoxos" que anos mais tarde consideravam "Guerra e Paz" a mais perfeita criação novelística da Humanidade? ( e aqui não se enganavam muito,,,)

A Obra é o que fica, muito depois dos ossos hoje reduzidos a cinzas deixarem de habitar esta esfera. Nesse sentido o que se pode dizer, mesmo não idolatrando o estilo, é que deixem essa Obra passar pelo crivo do tempo, seguros de que,   para  um Português ter  em todo o mundo literário a fama e o proveito de José Saramago,  muita água ainda terá de passar pelo Tejo, desde a serra de Albarracin até à foz de Lisboa..

E é  isto que muita "gentinha" não lhe perdoa, a um "comunista" que ainda por cima disse "mal da religião dos seus pais!":  esta Fama enorme que teve em vida e depois de morto, o Respeito  que grangeou em todas as tertúlias literárias do mundo civilizado, o Nobel enfim  ...

Deixem lá... Essa "gentinha" é  maltosa mais dedicada  à Caras , à Lux e outras "HOLAS" , onde tudo o que se lê são legendas debaixo das fotografias...

Também foi a mesma gentinha que nunca soube onde tinha enterrado Luis de Camões... E que depois de muitos anos  morto lhe veio a lamber a memória em porcina devoção...

Como farão mais tarde a este Saramago, desde que a póstuma devoção lhes aumente os "cabedais", por alturas das votações. Vão por mim.

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