O Sr Elpídio – cuja prole mais tarde fez sociedade com um dos Horácios e abriram uma empresa de peças para automóveis que ainda hoje existe, ali mesmo à entrada de Gouveia – tinha , já deu para perceber, um nome algo peculiar.
Quando questionado sobre a razão do tal nome, nalguma das muitas vezes em que compartilhava o tinto do meu sogro na nossa adega, todo ele se “enxofrava” e não havia maneira de nos dizer mais do que “foi ideia do meu Padrinho, o que é que querem? O Homem nunca foi bom da cabeça…”
A história que corria, mas que obviamente nunca tivemos ocasião de comprovar, era que o Padrinho do Sr Elpídio tinha-o ido baptizar com o Pai , ambos já carregados de tanto tinto – pela celebração do nascimento - que até dava para os bafos alumiarem os altares todos da Igreja velha….
Chegados ao registo civil a ideia era chamar ao pequeno “Pedro”. Como de “Pedro” se passou a “Elpídio” ainda hoje ninguém – nem sequer o funcionário do Registo, que também foi chamado a colaborar na celebração – consegue compreender…
Este compadre Elpídio de meu Sogro escrevia algumas vezes para a França, lugar onde vários irmãos se encontravam a trabalhar. Alguns dos mais novos no “Batîment” , o mais velho e sortudo na “Rinault” onde se esmerava na montagem dos cabos eléctricos.
As cartas começavam sempre pela interpelação “Saberás que…” seguida pelas novidades da aldeia:
“- Saberás que casou fulano e sicrano, nasceu à Josefa uma filha, morreu o porco com a maleita, ainda se aproveitou a carne que foi o que valeu e já a vendemos para Lisboa que lá comem de tudo. Saberás também que o Padre Amândio amantizou-se na sacristia com a Jesuína do Tóino coça-colhão, foi uma vergonha e até cá veio o Bispo, as oliveiras vão assim, assim e o cabrão do Pastor roubou-me outra vez no peso dos queijos e já é a terceira vez e as ovelhas que para a próxima vão mas é comer merda quele aqui no lameiro nunca mais põe os cornos cus tem bem grandes como sabes melhor que ninguém mas isto nã é pra leres à Maria sff…”
E os irmãos – normalmente o que trabalhava na “Rinault” e era quase como um capo de famiglia - respondiam:
“- Saberás tu Elpídio que por aqui as coisas vão bem quando não vão mal e não há vinho na França, E o que há vem de Marrocos e não presta. E manda daí uma chouriça ou duas que ainda passam, garrafões é que não , ficam todos nos comilões da alfândega e estamos quase a ir de férias, daqui a dois anos já aí estamos e boa saúde que por aqui não tem faltado embora saberás que a Maria ia morrendo de uma inflamação num dedo do pé com alguma porcaria que aqui comeu. Na França come-se mal e em Paris ainda pior. Os franceses são porcos e não gostam da gente só os marselheses é que gostam alguma coisa, mas tão sempre à espreita para te roubar e têm piças comós porcos, mijam para o lado quando pensam que não os estamos a ver. Na Rinault é que se tábem embora não chegue aos calcanhares da Citroni que em Franca é o carro dos ricos que têm dinheiro, os Rinaults não prestam na parte eléctrica dos fios, e isso eu sei porque sou eu cus monto e às vezes não funciona logo que sai da usina. Nã compres aí Rinaults.”
Regressados os irmãos a pouco e pouco da França, ou com “Citronis” ou então com “Pijotes” quase novos, o Sr Elpídio deixou de frequentar tanto a Adega da família, embora , enquanto foi vivo, nunca deixasse de ser cliente do vinho do meu Sogro, comprando 10 ou 12 garrafões por ano para os petiscos familiares.
Uma dúvida apenas sempre me atazanou: se a ideia do desgraçado do nome “Elpídio” foi uma “névoa etílica” que deu ao padrinho, ao pai e sobretudo ao piroso do funcionário do Registo Civil que foi leitor de grego clássico na sua licenciatura mal amanhada e nunca concluída em Coimbra, porque diabo o deixou ele aos seus Filhos em herança de gosto mais do que duvidoso?
Mistérios…
Nota: Elpídio, do grego , significa “aquele que tem esperança”. Em que lhe mudem o raio do nome, acrescento eu….
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