sexta-feira, junho 03, 2011

Para Descansar a Vista

Na expectativa de uma mudança de regime, o que haverá de mais adequado para esta Sexta feira do que um poema sobre a "mudança"?
Do grande, enorme, Pablo Neruda, aqui magistralmente traduzido por Albano Martins,  deixo-vos esta jóia:


Não Me Sinto Mudar

Não me sinto mudar. Ontem eu era o mesmo.
O tempo passa lento sobre os meus entusiasmos
cada dia mais raros são os meus cepticismos,
nunca fui vítima sequer de um pequeno orgasmo
mental que derrubasse a canção dos meus dias
que rompesse as minhas dúvidas que apagasse o meu nome.

Não mudei. É um pouco mais de melancolia,
um pouco de tédio que me deram os homens.

Não mudei. Não mudo. O meu pai está muito velho.
As roseiras florescem, as mulheres partem
cada dia há mais meninas para cada conselho
para cada cansaço para cada bondade.

Por isso continuo o mesmo. Nas sepulturas antigas
os vermes raivosos desfazem a dor,
todos os homens pedem de mais para amanhã
eu não peço nada nem um pouco de mundo.

Mas num dia amargo, num dia distante
sentirei a raiva de não estender as mãos
de não erguer as asas da renovação.

Será talvez um pouco mais de melancolia
mas na certeza da crise tardia
farei uma primavera para o meu coração.

Pablo Neruda, in 'Cadernos de Temuco'
Tradução de Albano Martins

2 comentários:

Anônimo disse...

Muito adequada a escolha do poema de Pablo Neruda, sobretudo no momento em que, no Chile, se iniciou investigação para apurar se o poeta morreu realmente da doença de que padecia ou se teve uma "ajuda" dos esbirros de Pinochet.
Com a previsível vitória do centro-direita em Portugal, à esquerda, na Europa, restam a Espanha (por quanto tempo?), a Grécia (isto é, o partido mais votado nas últimas eleições da colónia grega do FMI foi o PASOK) e Chipre. Isto se considerarmos que o governo Sócrates era de esquerda, coisa que não é assim tão linear.
Para mim, o problema não é a direita estar no poder. O problema é que esta direita é, em muitos países, populista. No Courrier Internacional deste mês, há um curioso artigo sobre o crescente peso do populismo na política europeia e não só: populistas de direita e ultra-direita no poder em muitos países europeus, populistas de ultra-direita nos EUA na oposição a Obama, populistas de esquerda (o “amigo” Chávez e seu compincha Morales) e direita em alguns países da América Latina...
Se em Portugal, pelo menos no continente, não temos uma personagem ao nível do Berlusconi, os políticos portugueses enveredam muitas vezes pela facilidade do discurso populista. Aparentemente, já não vale a pena perder tempo com Sócrates, e o Paulinho das feiras, lavoura e submarinos é já sobejamente conhecido, repare-se, por isso, em Passos Coelho: quando, por exemplo, diz que quem recebe rendimento mínimo ou subsídio de desemprego devia prestar serviços à comunidade, como se um desempregado fosse um criminoso condenado a trabalho comunitário, o líder do PSD assume o discurso tipo “são todos uma cambada de malandros, não querem é trabalhar”. Ora, como alguns estudos já demonstraram, há pobreza em Portugal e a nossa economia não gera empregos suficientes. Em geral, ninguém é pobre ou desempregado porque quer. Se há pessoas que recebem subsídios a que não têm direito, investigue-se e puna-se. Não se queira é marginalizar e denegrir pessoas que já estão em situação crítica.
Será que o populismo também já está instalado no poder em Portugal?

Francisco Martins disse...

Comentário sobre filatelia:
Qual é a sua opinião sobre FDC e livros filatélicos?
Os coleccionadores têm de pagar os envelopes, selos e IVA - 23% sobre o envelope e selos para comprarem os fdc.
Estranhamente, quem compra o Portugal em selos, só paga os selos, tem o livro oferecido e não paga IVA.