No calendário litúrgico será esta a mais solene e importante época do ano. Assim mesmo para todos os cristãos que aqui em cima, na Serra, ainda vivem fervorosamente os preceitos da Igreja.
Pelo menos os mais velhos...
Nalgumas aldeias escondidas, lá para Loriga ou Alvoco, ainda o "compasso" pascal visita as casas dos paroquianos, com o pároco à frente. Aqui em baixo , mais perto da Cidade , o número de casas a visitar e a idade do Padre (ainda conheci o Reitor de Seia com uns bons "setentas" ) já há anos que descontinuaram o velho hábito.
Noto que a importância dada às solenidades da Semana Santa - Procissão do Círio, Procissão do Senhor Morto, "encomenda" das almas pelos cruzeiros, etc... - se vai esbatendo desde que, há exactamente 28 anos, pus aqui os pés pela primeira vez. Nem sei se ainda se mantém a tradição do pagamento da "bula" da Páscoa, que permitia aos fiéis comerem carne nas sextas feiras do ano seguinte.
Lembro-me bem que foi exactamente na Páscoa que conheci os meus sogros, no ano de 1979. Por natural recato e algum pudor não faço aqui o relato das vicissitudes enológico-gastronómicas dessa primeira visita...
Mas podem crer que foi - pelo menos para mim, mal habituado a cerveja e a whiskys - um acontecimento memorável , embora com recordações ligeiramente "difusas", sobretudo as das peripécias que terão ocorrido lá mais para o final da tarde...
Hoje em dia há hipermercados ao alcance das duas mãos, compram-se os agriões já depurados e prontos a utilizar, basta encomendar o cabrito ou o borrego no talho.
Nessa altura a que me refiro Borrego era mesmo apanhado no meio do rebanho (eu tentei fazê-lo muitas vezes, com pouca eficácia digo desde já) e os Agriões colhiam-se junto das ribeiras e eram desinfectados e lavados em casa.
Arroz-doce era feito com manteiga e leite de ovelha, sabor de excelência que só quem tem amigos ou familiares pastores poderá agora compartilhar.
O melhor queijo do ano devido aos Pastos algo tardios comia-se pela Páscoa, e não tanto em Janeiro, como o mito citadino apregoava. E falo do artesanal, do Pastor, que chegava a ter 3 Kg!
Os Padrinhos vestiam as afilhadas ou davam dinheiro aos afilhados, e por aí fora.
Perderam-se no meio do desenvolvimento dos últimos 30 anos algumas destas tradições e ganharam-se outras - os ovos de chocolate, as amêndoas - mas se se fizer o confronto em todas as vertentes da "modernidade" e não só nestas citadas, mais etnográficas, mas em todas as variáveis que influenciam a vida das pessoas , é óbvio que estamos hoje muitos passos à frente do que estávamos em 1979.
Basta pensar nas estradas, nas infraestruturas sanitárias, no aumento da esperança de vida e na diminuição da mortalidade infantil.
Todavia, para muitos serranos será difícil reconhecê-lo porque aqui o desemprego bate hoje forte, provocado pela falência generalizada da indústria têxtil que, nos seus tempos áureus, alimentava mais de 1000 famílias entre Seia e Gouveia.
Não nos esqueçamos porém que esses "tempos áureos" eram também os tempos obscuros da ditadura... Onde não havia Segurança Social de jeito, o pobre tinha sempre de ter algo de parte "para uma doença" e pagava-se (quando se pagava ) ao mês na mercearia e no padeiro...
É uma "pôrra " que não se possam ter ao mesmo tempo e PARA TODOS, emprego, desenvolvimento e democracia... Mas porquê? Será só Problema nosso?! Estamos na Europa e não num Terceiro Mundo...
Nesta altura da Páscoa cujo antiquíssimo significado está ligado a uma "passagem", a uma "mudança de rumo", a um "renascimento" , haja Esperança!
Boa Páscoa para todos os Leitores!
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