quinta-feira, abril 10, 2008

O Inimigo Público


A saga dos professores e funcionários administrativos das Escolas contra a utilização dos telemóveis nas aulas, ou até mesmo em todas as instalações das escolas, tem que se lhe diga...

Há quem defenda que o aluno deve pura e simplesmente deixar o TM em casa, mas também há quem ache que seria suficiente - no início de cada aula - fazer-se uma recolha dos possíveis "impetrantes", restituindo-os no final aos seus legítimos donos.

Estranha sociedade esta que - descobrindo uma nova "necessidade" artificialmente criada pelos profissionais de MKT das grandes operadoras e produtoras ( temos de tirar o chapéu a essa gente) - já não consegue viver hoje sem um "papagaio falante" pendurado no cinto, qual Colt 45 de antanho, ou escondido no bolso.
Não sou psicólogo, mas isso não me impede de ler - porventura mal - nas entrelinhas dos recentes desmandos de alunos contra professores por causa dos TM's, também uma protecção quase territorial do seu objecto, uma espécie de defesa tenaz dos "terrenos" onde o aluno se movimenta e que constituem a sua "reserva" de privacidade.

Quem já caçou animais selvagens de grande porte sabe do que estou a falar... Assim como quem costuma lidar com touros de lide, seja forcado, toureiro ou criador.

Li num antigo National Geographic que os Bosquímanes - senhores de uma completíssima cultura quaternária - sabem avaliar, quase que até à dimensão de um meio metro, até onde podem ir "gozar" com uma leoa. A partir desse ponto "mágico" a bicha levanta os olhos dourados e a mensagem que estes transmitem é simples: mais perto e ...morres.

Também o nosso jovem encontra no seu telemóvel resquícios de bem essencial , quase de animal de estimação querido, para não dizer de "familiar" de bruxas e de feiticeiros, que o fazem defender a respectiva posse tão irracionalmente quanto uma galinha do mato com algumas dezenas de gramas que se lança sobre uma raposa de 10 kg para salvar a sua prole...

Este apego irracional a um objecto que já não é apenas isso, mas quase um "Totem" pessoal, não nasceu instintivamente com as nossas crianças. Foi provocado e criado pela sociedade e pelos próprios pais, que descansam no TM sabendo que o filho ou a filha estão sempre à distância curta de um telefonema.

Dentro do TM estão amores, namoros, confidências, risos e lágrimas... É óbvio que para um, ou uma, adolescente seja tão precioso e privado quanto um antigo "Diário" que as respectivas mães escondiam debaixo do colchão...

E por isso o defendem de unhas afiadas e punhos em riste...

Fazem mal, está claro, mas a culpa não é só deles.
Faltará a esta gente nova , com o futuro pela frente, uma perspectiva de maior desapego aos bens materiais que mais não serão do que meios para atingir um fim, e nunca o fim em eles próprios...
É importante que os filhos por vezes encontrem nos Pais esse tipo de desapego - tendo embora em atenção que a vida não está para graças nem para deitar fora de borda os tostões sem mais nem menos.
Dar valor ao que se compra com o suor do trabalho é uma coisa, perfeitamente respeitável, mas fazer uma tragédia grega quando algum desses bens se parte ou desparece é outra... e , neste caso, nada bom exemplo para os descendentes.
Que diacho, de vez em quando também devemos saber dizer "que se lixe a taça" e assobiar para o lado...a bem da harmonia familiar e da aquisição de correctas perspectivas de vida por parte de quem de nós depende.

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