Um dos meus leitores acha que eu domino tudo o que escrevo. Tive que lhe dizer que não.
"Saber" é um termo relativo.
Quanto mais se sabe sobre alguma coisa , menos temos a noção dessa sapiência. Essa era a opinião de Einstein (sobre a física); de Bertrand Russel (sobre a filosofia) ; até de Sócrates ( o velho!) sobre a vida toda: "Só sei que nada sei".
Neste mundo esquisito quem fala mais alto e mais depressa convence normalmente o povo da sua tese, sem que a mesma seja provada e discutida. É o mundo dos demagogos fala-barato. Dos que por lerem algum artigo na wikipédia são já donos da matéria.
Trago aqui à colação o exemplo da série televisiva sobre a vida de Salazar, onde o escritor do guião dá por garantidas as várias relações extra-conjugais do antigo presidente do conselho, quando nenhum dos biógrafos universitários (daqueles que escrevem as teses de doutoramento) conseguiu jamais provar essas coisas...
Mas dava mais sex-appeal à série se os episódios metessem essas cenas. Claro!
Eu percebo de gastronomia sobretudo como cliente e leitor interessado e (muito ao de leve) como "fazedor". Tenho a obrigação de perceber alguma coisa sobre arte , livros e sobre selos, ando há 35 anos nessa vida. Durante 30 anos fui professor de modelos estocásticos de decisão, pelo que acho que estou encartado a "bater umas bolas" sobre estudos de opinião, sondagens, etc...
Quanto ao resto?
Quanto ao resto tenho opinião. Ter opinião é bom, é saudável, faz parte da vida democrática falar sobre todos os assuntos e defendermos as nossas convicções.
Nada disso implica que falamos com a autoridade da sapiência. Sobre futebol? Opinamos. Sobre política? Opinamos. Sobre a história de Portugal (recente ou mais longínqua)? Opinamos. Sobre os benefícios ou malefícios das energias renováveis? Opinamos.
E muitas vezes - sobre essas matérias - dizemos asneiras da boca para fora.
Evidentemente que não vou ao extremo da senhora e jovem jornalista que, visitando o Museu de Ílhavo dedicado à saga dos bacalhoeiros nacionais, perguntava aos investigadores se "era ali, na Ria de Aveiro, que se apanhava o bacalhau?"
Em relação aos conhecimentos enológicos - o mundo dos vinhos e os seus "artistas" - o panorama é aterrador.
Há mais especialistas de vinhos em Portugal do que bebedores. Admito (sem provas) que existe gente que nunca bebeu mas que fala abundantemente sobre brancos e tintos, castas e métodos de envelhecimento, temperaturas de serviço, fermentações malolátilas, stress hídrico e mais ou menos "madeira".
Eu sou um deles.
Para minha defesa direi que boto opinião reivindicativa sobre a matéria, MAS bebo moderadamente à refeição.
E direi ainda que tento seguir sempre o preceito de meu mestre Chambel (de saudosa memória):
-" Se forem precisas muitas palavras caras no acto da prova para justificar o vinho, ponham de lado. Se o vinho lhes agradar logo à primeira, no olhar, nariz e boca, bebam e recomendem".
Como justificar - a não ser pela minha ignorância crassa e pelo meu provincianismo - que já tive ocasiões em que me obriguei a beber um Romanée-Conti, face a uma plateia de reverentes companheiros, porque o vinho me sabia mal?
Diz quem sabe que para apreciar o muito bom faz falta a memória histórica e a experimentação. Assim mesmo com o caviar, até com a lampreia.
Mas de uma coisa que pode custar entre 1000€ (vinho novo) e mais de 30 000€ cada garrafa (para as garrafas dos anos clássicos) como se pode adquirir a tal "memória histórica"?
"Memória Histórica" é para os nossos Alvarinhos, Dãos da Pellada , Luis Patos, Tintos do Douro, e outros assim.
Acho eu, que não tenho "parecenças" com o Sr. Abramovich.
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