Amanhã não passo por aqui, tenho que fazer com a minha Santa cá de baixo.
Médicos e doutores outra vez... Mas no caso dela ( e Graças a Deus) é a revisão do milhão de km!!
Já lá não chego eu...
Vamos então aos poemas.
Em louvor da vida saudável e longa, aqui vai esta peça de Fernanda de Castro, autêntico hino de paz neste Outono da vida:
Alma Serena
Alma serena, a consciência pura,
assim eu quero a vida que me resta.
Saudade não é dor nem amargura,
dilui-se ao longe a derradeira festa.
Não me tentam as rotas da aventura,
agora sei que a minha estrada é esta:
difícil de subir, áspera e dura,
mas branca a urze, de oiro puro a giesta.
Assim meu canto fácil de entender,
como chuva a cair, planta a nascer,
como raiz na terra, água corrente.
Tão fácil o difícil verso obscuro!
Eu não canto, porém, atrás dum muro,
eu canto ao sol e para toda a gente.
Fernanda de Castro, in "Ronda das Horas Lentas"
Agora de meu mestre Borges, aqui fica um lamento em laia de remorso: não fui feliz!
Por muito que os alcatruzes da nora girem ao contrário é cada vez mais importante não nos esquecermos de ser felizes... Mesmo que substituindo o bife do lombo pelo carapau negrão!
E nunca se esqueçam do que escreveu Ferran Adrià (El Bule) : "Mais vale uma bela sardinha que uma lagosta medíocre!"
O Remorso
Cometi o pior desses pecados
Que podem cometer-se. Não fui sendo
Feliz. Que os glaciares do esquecimento
Me arrastem e me percam, despiedados.
Plos meus pais fui gerado para o jogo
Arriscado e tão belo que é a vida,
Para a terra e a água, o ar, o fogo.
Defraudei-os. Não fui feliz. Cumprida
Não foi sua vontade. A minha mente
Aplicou-se às simétricas porfias
Da arte, que entretece ninharias.
Valentia eu herdei. Não fui valente.
Não me abandona. Está sempre ao meu lado
A sombra de ter sido um desgraçado.
Jorge Luis Borges, in "A Moeda de Ferro"
Tradução de Fernando Pinto do Amaral
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