quinta-feira, dezembro 14, 2017
O optimista e o "outro"
O nosso Primeiro Ministro achou ontem em Bruxelas que 2017 foi um ano "saboroso". Estávamos livres das condições da Troika (bem, melhor dito, "de quase todas") ; tínhamos um português na presidência do Euro-grupo, o qual não confundiria a "malta" do Sul com ébrios mulherengos, as condições económicas melhoraram face a 2016, os juros da dívida baixam, etc...
Nada destas coisas será mentira.
O que ficou para dizer foram as outras coisas que o ano também nos trouxe, algumas delas bem mais complicadas: os incêndios e a morte de quase 100 pessoas, a doença legionella, as demissões no Governo, o sarilho na Auto-Europa...
Há quem olhe para as calamidades e veja oportunidades de futuro. Há quem olhe para os mesmos acontecimentos e veja apenas trevas e destruição. Um comerciante de sapatos chegado a África no dealbar do século XX via apenas grande oportunidade de negócio pela quantidade de malta que andava descalça, outro do mesmo ofício veio-se embora na semana seguinte, explicando que os sapatos ali não se venderiam.
Quem teria razão? Basta espreitar hoje para os documentários sobre África e ter o cuidado de olhar para os pés dos cidadãos. Porventura teriam ambos razão, embora em distintos segmentos de mercado.
O Dr. António Costa é um Optimista militante. Olha para o futuro na crença firme que este será melhor do que o passado. E, olhando para trás, no passado recente releva apenas os acontecimentos cor-de-rosa.
Sei bem como são estas pessoas. Eu próprio me acuso de ser um pouco assim.
A grande vantagem desta visão do mundo é a de acrescentar anos de vida ao impetrante. Sem cuidados nem preocupações manda-se o stress para as urtigas.
A maior desvantagem, sobretudo assinalada em casos extremos deste optimismo, é a do sonhador se afastar de tal forma da realidade que em vez de comprar um barco de borracha para fazer face às inundações, trata mas é de comprar uma cana de pesca e uns anzóis, convencido que o peixe virá ali ter com ele a casa.
Precaução na antecipação ao perigo ou remediar alegremente depois do acontecimento?
São duas estratégias distintas. E francamente não consigo decidir sobre qual será a melhor em todas as ocasiões. Pois a precaução quando é de mais também retira a alegria do mundo. Todos sabemos a história daquele cidadão que tantos cuidados tomava consigo (não bebia, não fumava, só comia o recomendado, fazia exercício regularmente, ia ao médico de três em três meses) que morreu cheio de saúde.
A poupança sem objectivo maltrata o corpo e apenas apazigua a consciência. A dissipação sem controlo põe em causa o dia de amanhã ( e o seguinte), satisfaz momentaneamente mas compromete o futuro.
Sem entrar em detalhes mais filosóficos parece ter aqui validade a frase antiga "No meio é que está a virtude".
Mas quem definirá esse "meio"? Numa recta de comportamentos mais ou menos despesistas, orientada a partir de "zero", o Optimista achará que o seu "meio" é lá mais para a frente. O Pessimista entende que o "meio" que se adequa à sua maneira de pensar é mais próximo do "zero".
Na altura de votar para as eleições legislativas, lá para 2019, votaremos "optimista" ou "pessimista"?
Pondo de lado as fidelidades amarradas aos partidos, se calhar o voto vai depender da forma como cada um de nós passou o ano anterior. Melhor ou pior.
Atenção a 2018!
terça-feira, outubro 24, 2017
O horrível rescaldo da tragédia
Uma coisa é sentir por interposta crónica, reportagem televisiva ou comentário, horror do que se passou no fim de semana de 15 de Outubro. Outra coisa é telefonar para os parentes nesse Domingo, não obter resposta e vir a saber mais tarde que o fogo tinha entrado na propriedade e que ali tudo se queimara excepto a casa de habitação.
O mal que vive afastado das nossas vidas impressiona por momentos, leva a tomadas de consciência e a pensamentos de ajuda (que podem ou não concretizar-se em boas acções) mas quase nunca nos tiram o apetite para o almoço. E quando tiram não é grande problema, porque ao jantar a inquietação passa a indisposição ligeira e já encontramos vontade para petiscar alguma coisita.
Melhor do que eu outros já notaram esta ligeireza de pensamento sobre o mal distante, que nos vai apertando o coração à medida que o perigo se aproxima. Uma coisa serão 270 mortos em inundações na China, outra muito diferente serão 159 mortos no terremoto de Amatrice, Itália.
Pessoas serão sempre pessoas, mas a proximidade importa. No fim de contas estamos na Europa. o "core" do mundo civilizado, onde é suposto a natureza estar mais ou menos controlada há centenas de anos. E onde não é suposto - neste século XXI - ocorrerem mais de 100 mortos em incêndios florestais, no mesmo ano.
Existem duas principais causas dos incêndios florestais no nosso país.
Uma delas tem séculos e resulta da substituição da floresta primeva (o carvalhal) por uma floresta de pinheiros e mais tarde de eucaliptos. Dizem os entendidos que a construção naval do século XV e XVI, em primeiro lugar, e depois a expansão da ferrovia e a necessidade de madeira para as travessas das linhas férreas, terão sido as principais causas da desflorestação das matas originais e da necessidade de plantar madeira mais rápida a crescer.
E ninguém negará que a floresta sempre verde de madeiras ricas em resina ou óleos essenciais arde mais e melhor do que uma floresta de árvores de folha caduca.
A outra razão é mais próxima de nós, remonta ao século XX e tem a ver com a progressiva desertificação do interior. Causada pela guerra colonial , pela industrialização e pela emigração no início, mas mesmo depois da revolução a melhoria das condições de vida abriu oportunidades nas cidades e no litoral mas fechou os horizontes de desenvolvimento nas aldeias do interior.
Sem pessoas jovens para tratar das terrenos, para cultivar, para pastorear e para lavrar, as terras incultas ficaram ao abandono, prontas a acumular material inflamável sem vigilância próxima.
Cito o biólogo Jorge Paiva, que escreveu em 2013:
"Correia da Cunha bem demonstrou que Portugal estava a ficar demograficamente desequilibrado, mas os políticos não o quiseram ouvir (aliás, não convinha). Já que não querem humanizar minimamente as montanhas com vigias durante o Verão, ao menos façam a ordenamento do território. Ribeiro Telles e tantos outros bem têm alertado para esta urgência. Mas os governantes nada têm feito. Arranjam sempre desculpas de vária ordem, quando a única razão para que isso ainda não tenha sido feito é não só porque dá imenso trabalho, como também porque daria muitos problemas com os proprietários rurais. Além disso, os resultados de um trabalho desses não são imediatos, o que é mau para "angariação" de votos nas eleições seguintes."
Parece que depois dos 100 mortos e do clamor público e notório este ordenamento do território irá finalmente ser feito. Estaremos cá para ver, mas convém esperarmos sentados.
Uma coisa parece certa: o combate aos incêndios por reacção está condenado ao fracasso.Por muito bons e valentes que sejam os bombeiros ( e são) e por muito profissional e competente que seja a estratégia.
A estratégia vencedora passa pela profilaxia, pela forma de minimizar as condições de deflagração.
Mas estamos em Portugal. Depois de amanhã menos se falará do assunto, ao fim de alguns meses ainda menos, os mortos não votam, e as prioridades serão reavaliadas . Daí alguma descrença nas medidas de profilaxia para estas tragédias.
Venha o pacto de regime. Pode ser que resolva. Honrando a nossa memória árabe, Insha'Allah.
O mal que vive afastado das nossas vidas impressiona por momentos, leva a tomadas de consciência e a pensamentos de ajuda (que podem ou não concretizar-se em boas acções) mas quase nunca nos tiram o apetite para o almoço. E quando tiram não é grande problema, porque ao jantar a inquietação passa a indisposição ligeira e já encontramos vontade para petiscar alguma coisita.
Melhor do que eu outros já notaram esta ligeireza de pensamento sobre o mal distante, que nos vai apertando o coração à medida que o perigo se aproxima. Uma coisa serão 270 mortos em inundações na China, outra muito diferente serão 159 mortos no terremoto de Amatrice, Itália.
Pessoas serão sempre pessoas, mas a proximidade importa. No fim de contas estamos na Europa. o "core" do mundo civilizado, onde é suposto a natureza estar mais ou menos controlada há centenas de anos. E onde não é suposto - neste século XXI - ocorrerem mais de 100 mortos em incêndios florestais, no mesmo ano.
Existem duas principais causas dos incêndios florestais no nosso país.
Uma delas tem séculos e resulta da substituição da floresta primeva (o carvalhal) por uma floresta de pinheiros e mais tarde de eucaliptos. Dizem os entendidos que a construção naval do século XV e XVI, em primeiro lugar, e depois a expansão da ferrovia e a necessidade de madeira para as travessas das linhas férreas, terão sido as principais causas da desflorestação das matas originais e da necessidade de plantar madeira mais rápida a crescer.
E ninguém negará que a floresta sempre verde de madeiras ricas em resina ou óleos essenciais arde mais e melhor do que uma floresta de árvores de folha caduca.
A outra razão é mais próxima de nós, remonta ao século XX e tem a ver com a progressiva desertificação do interior. Causada pela guerra colonial , pela industrialização e pela emigração no início, mas mesmo depois da revolução a melhoria das condições de vida abriu oportunidades nas cidades e no litoral mas fechou os horizontes de desenvolvimento nas aldeias do interior.
Sem pessoas jovens para tratar das terrenos, para cultivar, para pastorear e para lavrar, as terras incultas ficaram ao abandono, prontas a acumular material inflamável sem vigilância próxima.
Cito o biólogo Jorge Paiva, que escreveu em 2013:
"Correia da Cunha bem demonstrou que Portugal estava a ficar demograficamente desequilibrado, mas os políticos não o quiseram ouvir (aliás, não convinha). Já que não querem humanizar minimamente as montanhas com vigias durante o Verão, ao menos façam a ordenamento do território. Ribeiro Telles e tantos outros bem têm alertado para esta urgência. Mas os governantes nada têm feito. Arranjam sempre desculpas de vária ordem, quando a única razão para que isso ainda não tenha sido feito é não só porque dá imenso trabalho, como também porque daria muitos problemas com os proprietários rurais. Além disso, os resultados de um trabalho desses não são imediatos, o que é mau para "angariação" de votos nas eleições seguintes."
Parece que depois dos 100 mortos e do clamor público e notório este ordenamento do território irá finalmente ser feito. Estaremos cá para ver, mas convém esperarmos sentados.
Uma coisa parece certa: o combate aos incêndios por reacção está condenado ao fracasso.Por muito bons e valentes que sejam os bombeiros ( e são) e por muito profissional e competente que seja a estratégia.
A estratégia vencedora passa pela profilaxia, pela forma de minimizar as condições de deflagração.
Mas estamos em Portugal. Depois de amanhã menos se falará do assunto, ao fim de alguns meses ainda menos, os mortos não votam, e as prioridades serão reavaliadas . Daí alguma descrença nas medidas de profilaxia para estas tragédias.
Venha o pacto de regime. Pode ser que resolva. Honrando a nossa memória árabe, Insha'Allah.
sexta-feira, setembro 08, 2017
No regresso ao trabalho recordando John Ashbery
Não foi por causa do regresso ao trabalho, mas nesta semana, mais precisamente a 3 de Setembro, morreu John Ashbery aos 90 anos, considerado por muitos o maior poeta de língua inglesa do seu tempo, deste nosso tempo, portanto.
Ganhou tudo o que havia para ganhar em termos de poesia: Pulitzer, National Book Award,Yale Younger Poets Prize, Bollingen Prize, Ruth Lilly Poetry Prize, Griffin International Award, apenas para referir os mais conhecidos.
Tinha um temperamento difícil e irritava muitos críticos , alguns dos quais diziam que os seus poemas podiam ser interpretados como querendo dizer uma coisa ou exatamente o seu contrário. Foi um trabalhador da caneta e do papel, extremamente prolífico com mais de 30 livros publicados, para além de ter ainda sido professor universitário em Rochester. E tradutor de grande talento, tendo traduzido para inglês os grandes poetas surrealistas franceses.
Tania Kettenjian (The Guardian) talvez tenha resumido melhor, numa curta frase, tudo aquilo que Ashbery foi: "Enigmatic, confounding, genius, funny, unnerving, stunning, gay, mysterious".
E, acrescento eu, uma autêntica provocação para os seus milhões de leitores, onde me incluo.
Recordo a canção:
"Porque os imortais devem partir?
Descanse em paz odb, mas jamais jaz
Enquanto eu for capaz de te ouvir"
Dele , Ashbery, deixo aqui um curto poema "Crossroads in the Past":
Ganhou tudo o que havia para ganhar em termos de poesia: Pulitzer, National Book Award,Yale Younger Poets Prize, Bollingen Prize, Ruth Lilly Poetry Prize, Griffin International Award, apenas para referir os mais conhecidos.
Tinha um temperamento difícil e irritava muitos críticos , alguns dos quais diziam que os seus poemas podiam ser interpretados como querendo dizer uma coisa ou exatamente o seu contrário. Foi um trabalhador da caneta e do papel, extremamente prolífico com mais de 30 livros publicados, para além de ter ainda sido professor universitário em Rochester. E tradutor de grande talento, tendo traduzido para inglês os grandes poetas surrealistas franceses.
Tania Kettenjian (The Guardian) talvez tenha resumido melhor, numa curta frase, tudo aquilo que Ashbery foi: "Enigmatic, confounding, genius, funny, unnerving, stunning, gay, mysterious".
E, acrescento eu, uma autêntica provocação para os seus milhões de leitores, onde me incluo.
Recordo a canção:
"Porque os imortais devem partir?
Descanse em paz odb, mas jamais jaz
Enquanto eu for capaz de te ouvir"
(Faroeste)
Dele , Ashbery, deixo aqui um curto poema "Crossroads in the Past":
"That night the wind stirred in the forsythia bushes,
but it was a wrong one, blowing in the wrong direction.
That’s silly. How can there be a wrong direction?
‘It bloweth where it listeth,’ as you know, just as we do
when we make love or do something else there are no rules for.
I tell you, something went wrong there a while back.
Just don’t ask me what it was.
Pretend I’ve dropped the subject".
Descansar em paz não é para ele, que descanse então da maneira que mais lhe tenha agradado nesta vida.
segunda-feira, agosto 14, 2017
Laranja no Inverno
A "laranja" é um fruto tradicional do Inverno. Em Portugal (país que a introduziu na Europa vinda do Oriente) é no Algarve que tem mais fama. E vai daqui um abraço para a Cooperativa de Citricultores do Algarve (CACIAL) pelo trabalho que têm feito no apuramento das estirpes e na procura de mercados cada vez mais diferenciados para a nossa laranja.
Mas a "laranja" a que aqui me refiro não é a fruta, mas sim a cor. Segundo as especialistas, a cor laranja seria a "rainha" do Inverno de 2017 e apareceu em força nos desfiles de moda que antecipam a estação, sendo possível observar esta cor nos mais variados adornos femininos, em todos os blogs que se dedicam ao "street style".
Aliás, não só o "laranja" fará furor nas próximas estações como também o "amarelo" e o "vermelho", que por combinação se transformam na dita cuja, como sabemos.
Ando agora cada vez mais por fora destas tendências de moda. Nem me recordo do assunto me excitar assim tanto no passado, excepto quando tinha de "fazer de conta", para mostrar algum interesse em assunto onde a companheira de vida se atravessava.
As modernas "fashionistas"são definidas pelo Urban Dictionary como "A fashion nazi, someone who defines alternatively oneself and others by the clothes they wear".
Não é muito simpático... De todas as formas - segundo parece e está escrito (Huffington Post) - caso se retirassem da Economia em geral os efeitos da Indústria de Moda (diretos e indiretos) estima-se que a recessão de 2011 teria sido dez vezes pior...
É este o poder da "moda". O consumo que gera causado pelos muitos milhões de aderentes que preferem passar a hora do almoço a "lamber as montras" do que a "lamber uma colher". Contribuindo dessa forma igualmente para esticarem cada vez mais o seu perfil, o que também está "na moda".
Quem tem dinheiro para comprar habitualmente haute couture, a 40 000 euros cada criação original? Uns milhares de pessoas em todo o mundo. E quem tem dinheiro para comprar um Picasso hoje? Idem , idem...
Mas quase todas podem andar com uns "jeans" da mesma marca milionária , ou ter em casa uma reprodução da Guernica.
O Bentley Bentayga custa "apenas" 300 000 euros . E o feliz e raro comprador pode ainda ser convidado a gastar mais 200 000 eurinhos no relógio de tablier que é proposto como opção: um Mulliner Tourbillon da Bretling.
Quem pode, pode. Quem não pode compra um Volkswagen Polo por 15 000 euros. É a vida.
(Já agora devem saber que a Bentley pertence à Volkswagen? Tal como a proletária indiana Tata Motors comprou a colonialista Range Rover... São as voltas que o mundo dá e as teias que o império tece.)
A "moda" para as senhoras e senhores que lhe dão importância pode ser assim entendida como as revistas de automóveis de hoje: têm que ter o artigo central com o Lamborghini Veneno Roadster, para atrair leitores, mas depois fazem os testes nas outras páginas aos Renault Clio e aos Nissan Micra.
Resta o caso da malta obtusa, onde me incluo, que não liga a marcas nem a coordenação de cores para além do óbvio "ululante". Esta malta compra a roupa que lhe serve, emociona-se quando encontra um fornecedor que acerta com o tamanho e enternece-se quando usa pela milionésima vez o velho blazer azul escuro (praticamente tratado como se fosse uma pessoa de família).
Recordo-me de ter uma vez comprado um casaco na Aquascutum de Londres, ainda na Regent Street, 100. Era em tweed verde escuro e vesti-o até que o volume do corpo já não permitiu. Dei-o depois ao meu sogro que ainda o usou até falecer. Esse casaco prestou bons e leais serviços durante mais de 20 anos. Foi caro, mas "amortizou" o investimento muito para além do prazo que seria esperado.
Não aposto é que o fiel casaco teria estado esses 20 anos sempre "na moda". Durante esses anos os gurus da "moda de homem" mudaram os botões , mudaram as rachas nas costas, mudaram o número de bolsos à frente, mudaram a silhueta do confortável para o estilizado, e vice-versa.
Lembrando-me dessa frivolidade cometida no final dos anos 70 do século passado, há dias em que ainda sonho possuir um fato Brioni feito por medida. E, já agora, entrar com ele no Plaza de Nova Iorque com a Virginie Ledoyen pelo braço, depois de ter dado a chave do Bentley (com relógio) ao porteiro.
Sonhar não custa nada. Para quem ainda não toma comprimidos para adormecer. Como eu.
Mas a "laranja" a que aqui me refiro não é a fruta, mas sim a cor. Segundo as especialistas, a cor laranja seria a "rainha" do Inverno de 2017 e apareceu em força nos desfiles de moda que antecipam a estação, sendo possível observar esta cor nos mais variados adornos femininos, em todos os blogs que se dedicam ao "street style".
Aliás, não só o "laranja" fará furor nas próximas estações como também o "amarelo" e o "vermelho", que por combinação se transformam na dita cuja, como sabemos.
Ando agora cada vez mais por fora destas tendências de moda. Nem me recordo do assunto me excitar assim tanto no passado, excepto quando tinha de "fazer de conta", para mostrar algum interesse em assunto onde a companheira de vida se atravessava.
As modernas "fashionistas"são definidas pelo Urban Dictionary como "A fashion nazi, someone who defines alternatively oneself and others by the clothes they wear".
Não é muito simpático... De todas as formas - segundo parece e está escrito (Huffington Post) - caso se retirassem da Economia em geral os efeitos da Indústria de Moda (diretos e indiretos) estima-se que a recessão de 2011 teria sido dez vezes pior...
É este o poder da "moda". O consumo que gera causado pelos muitos milhões de aderentes que preferem passar a hora do almoço a "lamber as montras" do que a "lamber uma colher". Contribuindo dessa forma igualmente para esticarem cada vez mais o seu perfil, o que também está "na moda".
Quem tem dinheiro para comprar habitualmente haute couture, a 40 000 euros cada criação original? Uns milhares de pessoas em todo o mundo. E quem tem dinheiro para comprar um Picasso hoje? Idem , idem...
Mas quase todas podem andar com uns "jeans" da mesma marca milionária , ou ter em casa uma reprodução da Guernica.
O Bentley Bentayga custa "apenas" 300 000 euros . E o feliz e raro comprador pode ainda ser convidado a gastar mais 200 000 eurinhos no relógio de tablier que é proposto como opção: um Mulliner Tourbillon da Bretling.
Quem pode, pode. Quem não pode compra um Volkswagen Polo por 15 000 euros. É a vida.
(Já agora devem saber que a Bentley pertence à Volkswagen? Tal como a proletária indiana Tata Motors comprou a colonialista Range Rover... São as voltas que o mundo dá e as teias que o império tece.)
A "moda" para as senhoras e senhores que lhe dão importância pode ser assim entendida como as revistas de automóveis de hoje: têm que ter o artigo central com o Lamborghini Veneno Roadster, para atrair leitores, mas depois fazem os testes nas outras páginas aos Renault Clio e aos Nissan Micra.
Resta o caso da malta obtusa, onde me incluo, que não liga a marcas nem a coordenação de cores para além do óbvio "ululante". Esta malta compra a roupa que lhe serve, emociona-se quando encontra um fornecedor que acerta com o tamanho e enternece-se quando usa pela milionésima vez o velho blazer azul escuro (praticamente tratado como se fosse uma pessoa de família).
Recordo-me de ter uma vez comprado um casaco na Aquascutum de Londres, ainda na Regent Street, 100. Era em tweed verde escuro e vesti-o até que o volume do corpo já não permitiu. Dei-o depois ao meu sogro que ainda o usou até falecer. Esse casaco prestou bons e leais serviços durante mais de 20 anos. Foi caro, mas "amortizou" o investimento muito para além do prazo que seria esperado.
Não aposto é que o fiel casaco teria estado esses 20 anos sempre "na moda". Durante esses anos os gurus da "moda de homem" mudaram os botões , mudaram as rachas nas costas, mudaram o número de bolsos à frente, mudaram a silhueta do confortável para o estilizado, e vice-versa.
Lembrando-me dessa frivolidade cometida no final dos anos 70 do século passado, há dias em que ainda sonho possuir um fato Brioni feito por medida. E, já agora, entrar com ele no Plaza de Nova Iorque com a Virginie Ledoyen pelo braço, depois de ter dado a chave do Bentley (com relógio) ao porteiro.
Sonhar não custa nada. Para quem ainda não toma comprimidos para adormecer. Como eu.
quinta-feira, agosto 10, 2017
A desertificação da cidade causa alguma sede...
Entrando pelo mês de Agosto os sinais de férias multiplicam-se em Lisboa e penso que também nas outras cidades do país. Não será já como foi outrora, onde parecia que a cidade fechava um mês para obras, mas mesmo assim notam-se diferenças notáveis no dia-a-dia de quem passa, trabalha ou vive nos Burgos.
Mês de Agosto é também mês de férias ao contrário, de imigração turística. E Lisboa afina por esse diapasão cada vez mais. Tal como Barcelona e Paris ( para citar exemplos que conheço) cidades que por força dos muitos milhares de visitantes ficam descaracterizadas nestas alturas.
Como costumava dizer um amigo meu catalão:
-"Em Agosto todos os "pixapins" se vão embora! Só a igreja do Gaudi não foge porque é de pedra".
Nota: Pixapin , Camaco ou Ets de Can Fanga, são nomes dos barceloneses em calão local.
Só as pedras não fogem , porque não podem. E em Lisboa será o mesmo. Ou não?
Para quem ainda trabalha nesse mês existem vantagens interessantes, como a diminuição do fluxo de automóveis na estrada, a maior facilidade em estacionar, ou ainda a possibilidade de frequentar restaurantes com mais calma, sobretudo aqueles que estão fora dos guias turísticos internacionais.
Por exemplo, num destes dias pude ir almoçar com uma trupe engraçada ao Bel'Empada, no cruzamento da Avenida de Roma com a João XXI, deixando o carro quase ao lado da porta,
E como o Sr. Belmiro apenas tem capacidade para 10 ou 12 convivas, não imaginam a alegria que foi ter chegado às 13h e deparar com três mesas vazias!
Alegria para o grupo de manducantes, porque para o proprietário talvez não... Não existem mundos perfeitos, com sol na eira e chuva no nabal.
A ideia era trazermos vinhos para prova. E a desculpa era a canícula, o calor que fazia e a desertificação da cidade ambos convidavam a refrescar as gargantas.
Pensemos no bar colonial lá para o Cairo, onde T.E. Lawrence , regressado da última conversa na tenda de Faiçal, se encostaria para um Gin&Tonic.
Mesmo sem Peter O'Toole ao nosso lado beberam-se nessa ocasião , e começando pelos brancos, um Chardonnay alentejano da Figueirinha 2015, excelente; Dory de viosinho e alvarinho, um Douro muito interessante ; e um Espumante millesimé vinificado em Távora-Varosa, bom , mas sem deslumbrar.
E depois passámos aos tintos: de Susana Esteban o Aventura de 2014, alentejano das terras altas que mostrou vigor e frescura; Quinta da Leda 2004 (de cair para o lado!); um Priorat de 96 soberbo ainda, aristocrata seco e fino; E como surpresa um Cartuxa de 92. Velho, sim, mas não acabado, cheio de sabedoria e a convidar para ser bebido sozinho e lentamente.
Para aguentar tanto líquido apresentaram-se na mesa: Queijos de Castelo Branco, requeijões de Serpa, "terrine de viande" ali mesmo feita pelo Sr. Belmiro, pimentos de Padrón e dos outros, as inevitáveis empadas que dão nome à casa, com recheio de galinha e enchidos. Sopa de Beldroegas e um belo Pernil assado no forno.
Bem podia ser sempre assim. Refiro-me à facilidade de estacionamento e à ausência de filas para as mesas. Porque quanto ao resto, boa comida e a preços maneirinhos, já o Amigo Belmiro nos habituou seja em Agosto, Abril ou Dezembro.
quarta-feira, julho 26, 2017
Desencontros
Nunca fui muito apologista da filosofia "carpe diem".
Melhor dito, teoricamente a ideia sempre me atraiu. Na prática, deixei-a nos livros que li - "On the road" do Kerouac, por exemplo - ou nos filmes que vi . E aqui vem à memória o iconoclasta Buñuel e o magnífico "O Obscuro Objecto do Desejo".
Isto de um cidadão viver cada dia como se fosse o último, não prevendo o futuro nem olhando para o conteúdo da carteira, sempre me pareceu que ficava melhor em ficção do que na vida real. Sobretudo para quem tem obrigações a montante e a jusante (idosos a cargo e filhos ou netos por quem olhar).
Vontade acho que nunca me faltou, mas não tive a coragem de levar por diante a ânsia de liberdade pessoal à custa do resto. Sendo que o "resto" pesa.
A consequência de viver com um olho no burro e outro no meliante significa que se leva normalmente o burro para casa. O que é importante para quem tem apenas um burro. Quem possuir uma "burrada" de burros e burras pode perder algum de vez em quando.
Um dos meus maiores amigos costumava gritar (em "petit comité"): Um dia hei-de ser livre!
Querendo com isto dizer que havia de chegar o dia em que poderia fazer o que lhe apetecesse, sem olhar a restrições de trabalho, familiares ou financeiras.
Porque até para ser livre é preciso riqueza, como diria o gerente de conta lá no banco, a tentar convencer a malta a investir nalguma coisa mais arriscada.
A conversa vai longa. Passemos então ao cerne da questão: o facto é que já me tenho arrependido de por vezes não ter mandado a prudência às urtigas e assumido alguma atitude mais revolucionária.
E não falo apenas da escolha da cor de algum casaco novo.
Uma decisão bem mais atrevida! Como a de reservar uma semana de férias para mim próprio.
Ir a Paris vaguear pelo Quai Branly e ver a exposição sobre o Picasso Primitivo (fecha no fim deste mês), almoçar no Lucas Carton, que depois do grande Alain Senderens tem nova gerência (Julien Dumas) que está bastante bem cotada nos periódicos parisienses da especialidade .
Passear longamente pelas livrarias da Rive Gauche, ao lado da Sorbonne, à procura de velhos textos.
Matar saudades do L'Ardoise, perto do Cour des Comptes (Mont Thabor).
Espreitar a exposição (que dizem ser notável) Anarcheologie no Centro Pompidou:
Tout pouvoir, écrit Michel Foucault, ne repose jamais que sur la contingence et la fragilité d’une histoire ». Le développement de l’archéologie comme « science du commencement », au début du 19e siècle.
E, muito importante, acabar as noites no Méridien l'Étoile , mergulhado numa sessão de Jazz na famosa sala de espectáculos com o mesmo nome, considerada um dos melhores jazz clubs da Europa. Podem ver aqui na foto.
Cinco dias em Paris. 5000 euros para gastar (alguns dos quais em vinhos...).
Não parece inatingível. Não é nenhuma estadia numa ilha para milionários, não estamos a falar de uma digressão pelo Nepal à procura de "iluminação". Ou de uma visita às Maldivas para nadar no meio dos tubarões (penso que dentro de jaulas).
Vamos sonhando e pelo sonho é que vamos. Ou ficamos em casa...
E quanto ao casaco, depois de muito pensar, será azul, como os outros 3 que estão lá pendurados no meu armário...
Um dia serei livre. Mas não será ainda amanhã.
quinta-feira, junho 22, 2017
Calamidade
A desgraça assolou o grande Pinhal Interior Norte sob a forma de um violento incêndio que deflagrou perto de Pedrogão Grande, no final da tarde de 17 de Junho.
Os números da fatalidade são chocantes. Estávamos habituados a que fossem medidos em "ha" ardidos de floresta, o que por si só já era penoso, e não em vidas humanas perdidas.
Considero que estamos ainda muito próximos do evento para ter capacidade de reflectir com racionalidade sobre as causas, a reacção, a coordenação, o envolvimento dos meios e a eficácia do combate às chamas.
Ponho-me de fora destas matérias. Não as conheço. Não posso dar uma opinião séria.
Sobre o desenvolvimento do assunto todos pensamos alguma coisa com certeza. Nem que seja o óbvio: Não seria possível impedir a perda de vidas, sobretudo naquela estrada fatídica?
- "Porque não fecharam a estrada?"
Mas não se trata de futebol, nem aqui se pedem treinadores de bancada. E, talvez mais importante do que tudo o resto, dar palpites depois de saber o resultado não configura grande perspicácia...
Penso que o País deve exigir uma análise serena e profunda sobre este caso, se possível feita a frio e com peritos que sejam independentes dos que estiveram envolvidos no teatro das operações. E rápida. Não antevejo pior situação do que cairmos no marasmo de uma "Comissão" que leva dois anos a estudar e mais seis meses para escrever o relatório.
Exonerar ou culpar os intervenientes é importante para que os cidadãos compreendam a justiça e recuperem a confiança. Mesmo se a grande causa da propagação incendiária se deveu também a grave incúria dos proprietários na limpeza das suas matas.
No rescaldo deste gravíssimo incidente recordo aqui o agradecimento da Senhora Secretária de Estado da Segurança Social aos CTT-Correios de Portugal e aos nossos carteiros.
Quando foi necessário cumprir a tristíssima tarefa de confirmar se existiriam ainda mais pessoas mortas dentro das casas que foram pasto das chamas, foram os carteiros que guiaram as equipas de resgate e salvamento pelos caminhos ainda a arder daquelas freguesias. Apenas eles sabiam onde eram as casas e quem nelas morava.
Os números da fatalidade são chocantes. Estávamos habituados a que fossem medidos em "ha" ardidos de floresta, o que por si só já era penoso, e não em vidas humanas perdidas.
Considero que estamos ainda muito próximos do evento para ter capacidade de reflectir com racionalidade sobre as causas, a reacção, a coordenação, o envolvimento dos meios e a eficácia do combate às chamas.
Ponho-me de fora destas matérias. Não as conheço. Não posso dar uma opinião séria.
Sobre o desenvolvimento do assunto todos pensamos alguma coisa com certeza. Nem que seja o óbvio: Não seria possível impedir a perda de vidas, sobretudo naquela estrada fatídica?
- "Porque não fecharam a estrada?"
Mas não se trata de futebol, nem aqui se pedem treinadores de bancada. E, talvez mais importante do que tudo o resto, dar palpites depois de saber o resultado não configura grande perspicácia...
Penso que o País deve exigir uma análise serena e profunda sobre este caso, se possível feita a frio e com peritos que sejam independentes dos que estiveram envolvidos no teatro das operações. E rápida. Não antevejo pior situação do que cairmos no marasmo de uma "Comissão" que leva dois anos a estudar e mais seis meses para escrever o relatório.
Exonerar ou culpar os intervenientes é importante para que os cidadãos compreendam a justiça e recuperem a confiança. Mesmo se a grande causa da propagação incendiária se deveu também a grave incúria dos proprietários na limpeza das suas matas.
No rescaldo deste gravíssimo incidente recordo aqui o agradecimento da Senhora Secretária de Estado da Segurança Social aos CTT-Correios de Portugal e aos nossos carteiros.
Quando foi necessário cumprir a tristíssima tarefa de confirmar se existiriam ainda mais pessoas mortas dentro das casas que foram pasto das chamas, foram os carteiros que guiaram as equipas de resgate e salvamento pelos caminhos ainda a arder daquelas freguesias. Apenas eles sabiam onde eram as casas e quem nelas morava.
segunda-feira, junho 12, 2017
O que fazer na "silly season" ? Leiam!
O período do ano em que os MCS se vêm mais aflitos para nos abastecerem de notícias com alguma relevância está a começar.
Acabou o futebol, começam as "Marchas". E há mais descanso na política - embora aqui já tivesse havido um período de nojo maior. Ter-se-á perdido o respeito pela água do mar e pelas férias dos nossos deputados.
Nas empresas o Verão ainda se nota? Sim. E quem duvida desta afirmação, seguro que o país se modernizou e está a um pequeno patamar da Europa do Norte, que tente fazer um livro com saída prevista para Setembro.
Em Agosto as gráficas não fecham e os gabinetes de design ainda trabalham? Pode ser que sim, mas a laboração é na maioria das vezes com menos de metade dos trabalhadores. Estamos a trabalhar! Não fazemos é a maior parte das coisas que era suposto fazermos. O que, bem pensado, deve dar enorme conforto ao cliente.
Lembra-me uma cena verdadeira passada com um antigo presidente da minha empresa, dirigindo-se a um colega de um Centro de Operações da época, que teria sido ensinado previamente a nunca dizer-lhe que não:
-"Ouça Lá! O Senhor diga-me se esta máquina ainda é muito utilizada?
- "Sr. Presidente a máquina ainda faz alguma coisa, mas pouca..."
- "E ainda a usamos?"
- "Sr. Presidente, usamo-la muito pouco"
- "E em que circunstâncias?"
- "Quase nunca Sr. Presidente".
- " Já percebi. A máquina faz pouco e o pouco que faz não serve para nada. Parece uma Comissão."
(hoje diríamos "um grupo de trabalho"...
Uma boa aposta para esta "saison" é aproveitar a Feira do Livro e abastecer-nos de leitura para o resto do ano. E em aperitivo ( há tanto tempo que não publico aqui poemas) aqui vos deixo uns versos.
Saudando Manuel Alegre, o prémio Camões deste ano. E bem a preceito aqui vai um soneto "Sobre um mote de Camões". A caricatura é de André Carrilho.
Acabou o futebol, começam as "Marchas". E há mais descanso na política - embora aqui já tivesse havido um período de nojo maior. Ter-se-á perdido o respeito pela água do mar e pelas férias dos nossos deputados.
Nas empresas o Verão ainda se nota? Sim. E quem duvida desta afirmação, seguro que o país se modernizou e está a um pequeno patamar da Europa do Norte, que tente fazer um livro com saída prevista para Setembro.
Em Agosto as gráficas não fecham e os gabinetes de design ainda trabalham? Pode ser que sim, mas a laboração é na maioria das vezes com menos de metade dos trabalhadores. Estamos a trabalhar! Não fazemos é a maior parte das coisas que era suposto fazermos. O que, bem pensado, deve dar enorme conforto ao cliente.
Lembra-me uma cena verdadeira passada com um antigo presidente da minha empresa, dirigindo-se a um colega de um Centro de Operações da época, que teria sido ensinado previamente a nunca dizer-lhe que não:
-"Ouça Lá! O Senhor diga-me se esta máquina ainda é muito utilizada?
- "Sr. Presidente a máquina ainda faz alguma coisa, mas pouca..."
- "E ainda a usamos?"
- "Sr. Presidente, usamo-la muito pouco"
- "E em que circunstâncias?"
- "Quase nunca Sr. Presidente".
- " Já percebi. A máquina faz pouco e o pouco que faz não serve para nada. Parece uma Comissão."
(hoje diríamos "um grupo de trabalho"...
Uma boa aposta para esta "saison" é aproveitar a Feira do Livro e abastecer-nos de leitura para o resto do ano. E em aperitivo ( há tanto tempo que não publico aqui poemas) aqui vos deixo uns versos.
Saudando Manuel Alegre, o prémio Camões deste ano. E bem a preceito aqui vai um soneto "Sobre um mote de Camões". A caricatura é de André Carrilho.
Sobre um mote de Camões
Se me desta terra for
eu vos levarei amor.
Nem amor deixo na terra
que deixando levarei.
Deixo a dor de te deixar
na terra onde amor não vive
na que levar levarei
amor onde só dor tive.
Nem amor pode ser livre
se não há na terra amor.
Deixo a dor de não levar
a dor de onde amor não vive.
E levo a terra que deixo
onde deixo a dor que tive.
Na que levar levarei
este amor que é livre livre.
Manuel Alegre
segunda-feira, maio 22, 2017
O fim dos tempos?
Não desejo enveredar pelo comentário às mensagens de Apocalipse que abundam em redor do 3º segredo de Fátima, do calendário dos Maias, ou de outra coisa qualquer igualmente excitante (para os aficionados da matéria).
Também não me parece muito sensato. Desde que o 2000 veio e nada acabou, seguindo-se o 2012 que também passou (apesar dos Maias), as teorias de "fim do mundo" perderam um pouco da credibilidade.
Acabar acabamos todos os dias. Hoje uns, amanhã os outros. Ficar cá para semente não vai acontecer a ninguém. Só se for como adubo.
E a questão da reencarnação parece mal encaminhada se levarmos em conta a matemática...Uma questão de contagem de corpos e de almas, de nascimentos e de mortes... A não ser que acreditemos na sua generalização a animais e plantas ( metempsicose).
As teorias da metempsicose, eram valorizadas no oriente budista (do Tibete) , de onde se estenderam ao Egipto e à Grécia. Cá mais para Ocidente terão sido os Cátaros os seus apóstolos mais conhecidos. Devem lembrar-se que esses Albigenses também não acabaram muito bem, apesar da doutrina muito pura que defendiam e que a nós parece hoje sábia.
Eu não sei se gostaria de reencarnar (salvo seja) nalguma planta... Se fosse mesmo preciso podia ser num carvalho (pensei no sobreiro, mas anda com doenças). A oliveira dura mais tempo, mas batem-lhe todos os anos com um pau e ainda por cima andam todas a ser clonadas ...
E quem quer ser animal nos tempos que correm? Só se for um insecto , uma barata daquelas que resistem a tudo o que lhes deitam.
Desde que li que essas bichas desenvolvem-se alegremente no Atol de Bikini ( o dos testes nucleares) fiquei com uma inveja desgraçada.
Conheço é pouco a vida social (e a outra) das baratas. Tenho de me informar.
Mas enfim, vem este texto quase bíblico a propósito da 1ª viagem externa do Presidente Donald Trump , e das pessoas com quem se vai encontrar:
Islamitas fundamentalistas da Arábia Saudita, Judeus de Israel, Sua Santidade o Papa, em Roma.
Será que o homem Trump sabe alguma coisa que nós não sabemos ainda? E que anda a ver se há escapatória junto das religiões mais conceituadas do planeta? Do tipo, organizo um leilão e entrego a alma a quem oferecer mais garantias, depois de negociação?
Francamente que fiquei preocupado. De todas as formas já decidi. Se o fim do mundo por aí vier encontra-me em casa, sentado no sofá, com o Barca Velha de 2008 num copo e um naco de queijo da serra na outra mão.
E espero que ao chegar não demore muito a fazer o serviço. Contrariamente a outras coisas que carecem de tempo, sou apologista de despedidas rápidas, e sem dor.
sexta-feira, maio 12, 2017
Por onde andas Blogger??
Estranhando a minha ausência continuada deste fórum, alguns amigos questionaram o que se passava.
A situação é simples, comecei a colaborar há largos meses (pro bono, evidentemente) num site cultural muito engraçado e que recomendo a todos, o que me vai tirando tempo para aqui passar quase todos os dias, como era costume.
Não posso dar muitos pormenores, porque a minha colaboração é sob pseudónimo. Mas aqui vai o nome do site para poderem ver e apreciar, porque tem muito que ler e ainda mais para aprender.
Chama-se gerador.eu
E aqui têm o endereço que os manda logo para a parte das crónicas:
http://gerador.eu/topico/cronicas/
quarta-feira, abril 12, 2017
Tempos idos
Na Páscoa era meu costume partir para a aldeia na Serra da Estrela. Tínhamos essa combinação quase desde que casei: Páscoa na Serra, Natal no Estoril. E funcionava bem.
A muita idade e as maleitas das senhoras cá de baixo complicaram esta aparentemente simples aritmética. Sem licença para deixar as "santas" cá de baixo sozinhas ( e sendo que a hipótese de apoio fora de casa nem sempre é possível e não é bem vinda) temos de fazer o que podemos. Neste caso será aqui ficar no Estoril a tomar conta do "assunto".
Para além da vontade de ver os amigos e familiares, a Páscoa na Estrela também era repositório de pequenos mimos muito bem vindos: a abertura do vinho novo, os queijos da serra no seu esplendor, o pão-de-ló quentinho a sair do forno. E, sempre, o cabrito ali criado no pasto para a mesa do Domingo de Páscoa.
Aproveitava-se a Quinta Feira para dar um salto ao Centro de Estudos Vitivinícolas de Nelas, para ver o que se poderia lá comprar, combinava~se um forrobodó com os amigos e parentes, lá mais para o final da tarde de Sábado... Esse tipo de pequenos prazeres.
O almoço de Páscoa era um banquete: Filetes de polvo , cabrito assado, "ervas" (esparregado de nabiças grosso), leite creme e arroz doce feitos com leite de ovelha e ovos caseiros, pão-de-ló e, a terminar, um queijo de entorna com mais de quilo e meio.
Normalmente sentávamos-nos por volta da 13h e só nos levantávamos para receber os parentes com os doces e o queijo, lá para as 17h.
Os vinhos branco e o tinto novos eram apresentados com orgulho nesse dia pela primeira vez à mesa - o que quer dizer que na adega já teriam sido bem provados... E para terminar em beleza as hostilidades abria-se uma garrafa de bagaceira velha, com mais de 20 anos em madeira de carvalho.
Jantar não havia. Quem queria comer qualquer coisa que trouxesse para a mesa presunto, queijo e algumas das febras do cabrito para fazer sandes.
Um dos casos estranhos desse dia era que todos juravam e trejuravam que à noite "nada podiam comer!" ."Estavam cheios até cima". Mas depois de verem a toalha na mesa e a minha sogra a cortar presunto lá se iam "arrimando"...
Por norma - nesses dias de video-gravadores - era costume acabar o serão a ver um filme que eu trazia cá de baixo. Sessão que tinha de se repetir na segunda feira depois do almoço, porque na noite do Domingo de Páscoa estava a malta toda um bocado "acelerada" e a ver a dobrar. Ou a triplicar...
Pode ser que ainda se venham a repetir essas boas práticas pascais lá na quinta, com todos os sobreviventes a erguerem o copo do bom vinho do Dão, saudando a memória dos que já partiram.
Mas por enquanto tem de ser assim. É a vida. E temos que ter paciência.
terça-feira, abril 04, 2017
Ir às compras é uma seca
Nunca gostei muito de perder tempo com as "compras". Seja o que for, desde sapatos, calças ou casacos para mim, até ao peixe para os almoços de fim de semana.
É bem certo que para reforçar esta atitude estão quase 18 anos a viver sozinho (ou pelo menos sem cara-metade).
Para as "mércolas" do dia-a-dia normalmente faço pesquisa daquilo que preciso, levo a lista das compras, e quanto mais depressa estiver a pagar e a sair da fila da caixa, melhor. Entro no Hiper às 8.30h, e pelas 9.30h já estou ao volante do carro outra vez, com as compras da semana feitas.
E no que toca à roupa tenho as mesmas preocupações. Normalmente só compro sapatos da "Hush Puppy's", porque sei que me serve bem o "43" sem ter de experimentar. Quando apanho alguma promoção nas lojas da marca levo logo 2 ou 3 pares e estou com o problema resolvido para o ano.
Casacos e calças são mais difíceis, atendendo à envergadura da alimária que se assina. Mas lá me vou arranjando, ou mandando fazer por medida ou utilizando o pronto a vestir em locais especiais onde os grandes tamanhos são bem vindos.
Acho penoso ter de me arrastar atrás de alguém que adora ver, mexer, bisbilhotar, comparar dezenas de preços e de qualidades, e só depois comprar. Era isto que as mulheres casadas (ou não) normalmente faziam, pelo que ainda pensei que a vida solitária me tinha livrado destas sinecuras...
Nada mais errado.
As santas nem sempre saem comigo ao Sábado (haja Deus!) mas quando saem tenho de me encher de paciência...
Ao fim de hora e meia de compras começo a ficar chateado e a querer ir-me embora, até porque se o almoço se atrasa tenho que ouvir das boas . Mas nada disso impede a progressão majestática , lenta e inexorável das santas dentro do hipermercado.
E o mais engraçado é que levam mais do que uma hora a dizer "podemos ir pagar"; "vamos para a caixa". Mas não vão. Há sempre mais um cantinho para bisbilhotar.
Agrava a situação o facto de que já têm dificuldade para ler e entender os preços. Desta forma , se as deixo sozinhas levamos mais meia hora a repor nos locais devidos o que compraram e já não querem (porque se enganaram). E não posso andar com elas ao meu lado, porque uma vai para Norte a outra para o Sul, com a desculpa de que "ela não tem nada que ver aquilo que eu compro".
Agora, o que será a cereja no topo do bolo? Querem saber? É quando alguma das santas encontra por acaso na mesma loja uma amiga do seu tempo. Nessas ocasiões bem posso dirigir-me à secção das revistas e ler o "l'Automobile" inteirinho enquanto espero pelo final da conversa.
Já para não dizer que muitas vezes têm de ir ao Lidl e depois ao Continente. Para "comprar coisas diferentes", segundo elas.
Uma destas manhãs de compras começa antes das 9.00h e acaba, já em casa, lá pelas 12.00h, com o frenesim de ir fazer o almoço, pôr a mesa e dar-lhes de comer antes de começar a dar a "Sara" na CMTV.
A "Sara"? É a "Escrava Isaura" em dialecto de santa de 87 anos...
Uma seca, como diria o Eça. Pior que seca. O deserto do Sahara é que aquilo é.
quinta-feira, março 23, 2017
Esta história dava um livro
Não tenho tido, na minha actividade como editor, dificuldade em arranjar temas para os livros que, ano a ano, saem com a chancela da nossa casa.
Pelo contrário, como temos boa fama como editores, o problema é poder escolher de entre as dezenas de temas que anualmente nos são propostos. E uma das coisas que mais me custa é ter de dizer a algum autor, com boas ideias:
-"Gostei muito da sua proposta, mas infelizmente temos o nosso plano editorial completo até 2020".
O que é verdade. Temos até 2020 os 4 a 5 títulos que lançamos por ano comprometidos, e ainda temos mais uns 12 em lista de espera.
Iniciando esta actividade em 1985, editámos até ao dia de hoje 287 livros .
Com especial relevo surgem os temas sobre o mar. Um pouco por causa das comemorações dos 500 anos dos descobrimentos portugueses, que levaram à edição de muitas obras relacionadas, debaixo da orientação do grande mestre que foi o Prof. Luis de Albuquerque.
Mas a gastronomia lato sensum está igualmente bem representada. São 11 títulos até ao final de 2016 desde o "Comer em Português", de José Quitério, com fotografia de Homem Cardoso, editado em 1997 (esgotado) . E temos já a fazer outro livro sobre "Chocolate em Portugal", de Fátima Moura, no seguimento da obra da mesma autora sobre "Café em Portugal".
Pensando bem, estes 11 livros representam mais de 50 000 páginas, em português e em inglês, que espalham por esse mundo as nossas tradições nesta área. Não conheço outro editor que possibilite tão larga divulgação da lusa gastronomia através de livros bilingues.
Não se pense que é um favor que fazemos. Do ponto de vista comercial resultam melhor estes livros sobre temas como o Vinho em Portugal (João Paulo Martins), Vinhas Velhas (Luis Antunes, com fotografias de Anabela Trindade) , ou a "Dieta Mediterrânica" (Fortunato da Câmara).
Mas como não somos uma editora especializada, teremos de ir intervalando estes temas com outros de índole diversa. E que entendemos assumirem também eles interesse cultural para o nosso público.
Para 2017 estamos já em trabalho avançado de edição dos seguintes títulos: "Fátima, 100 Anos" (Paulo Mendes Pinto); "Industria Têxtil em Portugal" (António Pereira); "Cafés Históricos de Portugal" (Samuel Alemão); "Rio Tejo, Berço de Civilizações" (Carmona Rodrigues).
terça-feira, março 14, 2017
Na "bisga"
Estive a ouvir calinadas um destes dias, enquanto esperava pelas 8 da manhã, altura em que abria a oficina onde ia deixar o carro da família. Para fazer tempo fui a um café frequentado pelo povo, onde me deliciei com as "bocarras" do pessoal trabalhador.
Não deixa de ser estranho como a escassos dois quilómetros da mundana Cascais existe de imediato a civilização suburbana que não só limita a a área onde se pavoneiam os chiques e betinhos como decididamente tem tendência para a engolir. Basta afastarmo-nos do mar e ir para o interior. Interior onde ainda haja fábricas! O que é cada vez mais raro neste país de serviços.
As expressões lusitanas mais antigas enriquecem-se com o calão dos trópicos, cada vez mais ouvido nesse enquadramento. "Na bisga" significa rapidamente. É hoje pouco utilizada, substituída pelas mais modernas "bolina", "esgalha", "na gáspia" ou "na mecha".
Nas filas dos Salesianos, à espera de entrar nas aulas, era costume algum aluno mais afoito lançar uma "bombarda" e partir "na bisga", antes que algum padre, ofendido pela má-criação ,lhe desse uma "lapada".
"Cavalona" e "cavalo de pau" (mulher grande ou magra e pequena) acho que já todos ouvimos dizer.
Mas "cavalo" já significa outra coisa que se consome (heroína ou um charro).
"Inhaca" é alguém que cheira mal, "lateiro" será comilão e "manolo" é um amigo, companheiro do coração.
Um "mijão" é um gajo com muita sorte. E "mitra" é o mesmo que "azeiteiro" no Norte do país (chuleco). E um piropo poderá ser algo como: "Oh jóia, vem aqui ao ourives".
E "Apanhar uma put*"? Nada que meta redes e mulheres! Significa embebedar-se bem.
Agora o que nunca tinha ainda ouvido, e achei deliciosa, foi a expressão:
- "Olha lá oh estúpido! Tás a confundir o olho do c* com a feira de Borba!" .
Temos que nos ir educando. Mas a pouco e pouco, porque muita cultura causa indigestão.
quinta-feira, fevereiro 23, 2017
São Favas Contadas!
Em bom português esta frase "Favas Contadas" significa que se conta como certo o prognóstico que foi feito. Por exemplo:
- "O SLB ganhar o campeonato de futebol deste ano são favas contadas!" (pensamento positivo...)
- "A passagem do SLB aos quartos de final da Champions não são favas contadas..." (e antes fossem...)
O termo dá o nome igualmente a alguns restaurantes. Pelo menos a dois que eu saiba. Um em Ponte de Lima e outro no Fonte Nova, em Lisboa. Nenhum é deslumbrante, mas ambos muito aceitáveis.
Mas agora o caso é mesmo falar um pouco da "fava" e dar a receita bem portuguesa das "Favas Guisadas com Entrecosto".
Sobre a "fava" dizem os entendidos:
A fava é uma leguminosa tendo, no geral, uma composição nutricional muito semelhante a outros alimentos deste grupo. Além do elevado teor em proteína de origem vegetal, a fava é rica em amido, um tipo de hidrato de carbono complexo, que proporciona ao organismo níveis de energia estáveis por um período de tempo considerável. É também rica em ferro, vitaminas do complexo B, magnésio, potássio, zinco e fósforo.
Nem vale a pena dizer que no período pré-ração era considerada uma das melhores alimentações que se podiam dar aos solípedes (burros, mulas e cavalos).
Talvez por isso, quando posso e há na ementa, gosto de ir comer estas favas ao Jockey do Campo Grande. Casa de bem comer já aqui amplamente referenciada e onde se devem continuar a alimentar alguns "solípedes"... Fora a gente boa que lá vai e onde incluo toda a presente companhia de leitores.
"Favas Guisadas" eram antigamente um prato de Primavera, e sem teimar muito, suponho que lisboeta ou de origem "saloia", aproveitando as favas tenrinhas das hortas em redor de Lisboa. Faço-o muitas vezes em casa, seguindo mais ou menos esta receita:
É preciso um tacho grande e de boa base, para que aguente o convívio com todos os ingredientes durante o processo de refogar e de cozer.
Corta-se o entrecosto, um chouriço de carne , um chouriço mouro e um bom toucinho magro , todos aos pedaços .
Fazemos uma puxadinha com bom azeite, cebola e alhos picados. Juntamos uma mão meia de sal grosso e salpicamos com pimenta preta moída.
Logo que comece a alourar, juntamos o toucinho e o entrecosto deixando suar um pouco e mexendo de vez em quando.
Adiciona-se a seguir um meio copo de vinho branco, duas colheres de sopa de uma base de tomate e o chouriço de carne, e voltamos a deixar refogar um pouco.
Depois metemos no tacho 5 dl de água e deixamos cozer até as carnes estarem a ficar tenras.
Quando o toucinho e o entrecosto estiverem quase cozidos, juntamos as favas, o chouriço mouro, um ramo de coentros grosseiramente cortados e mais um pouco de água.
Deixamos cozer, rectificamos de sal e pimenta preta.
Depois das favas cozidas, retiramos as carnes e deixamos apurar.
Normalmente acompanhamos com salada de alface temperada e polvilhada com coentros picados.
Um tinto indicado para este prato tradicional deve ser novo, vigoroso e fresco ao palato. Ou então...Que seja bom e vigoroso, deixemos a idade para outras núpcias!
O Quinta das Bágeiras Reserva de 2011 (por cerca de 12 euros quando saiu) está ainda um portento!
sexta-feira, fevereiro 10, 2017
Os Dentes
A minha "santa" mais sénior perdeu os dentes. Ainda se suspeitou que os tinha engolido, mas sendo uma prótese do maxilar inferior completa , penso eu (e os médicos) , que não haveria garganta para acomodar tal coisa.
Vistorias, inspecções e auditorias foram feitas pelas duas casas. Camas foram levantadas e feitas de novo, móveis afastados, lixos vasculhados. Nada de dentes avulso...
Exigiu uma radiografia e uma "retrografia" ao estômago (queria dizer uma "eco"). Como não a levei ao hospital a fazer aquilo agora não me fala. Ainda bem, que descanso as orelhas.
Sem prova do crime torna-se difícil provar o dito cujo. Aos dentes da "santa" terá sucedido o mesmo que ao corpo do Jimmy Hoffa, o mafioso desaparecido em 1975.
Ninguém mais lhe pôs a vista em cima. Ou está nas Ilhas Virgens de barriga para o ar, ou estará nos alicerces de cimento de algum arranha-céus de Chicago. O Hoffa! Porque a prótese da "santa" não é credível que descanse numa dessas paragens.
A pior consequência desta situação tem a ver com a dieta da criatura. Sem dentes de baixo mastiga mal. Torradas sem côdea, bananas esmagadas, purés de batata e souflés... É o que come.
Mas vendo que os outros mortais manducam da comida normal, não se cala com os impropérios. Critica que só faço isto ou aquilo agora, que ela não pode provar! E que a prótese já devia estar feita. E porque é que não há dentes já prontos a usar?!
Uma prótese naquelas idades é complicada de fazer. Já quase não existe gengiva, apenas uma pelita cobre o maxilar... O protésico bem lhe disse que "se calhar não valia a pena". Mas ia levando com o tabuleiro dos instrumentos pela cabeça abaixo.
-"Ora essa! Então hei-de andar na rua sem dentes? "
Aqui o problema será mais a vaidade do que a vontade de comer. Acho eu. Mas não digo em voz alta senão ainda sou eu a levar com o tabuleiro do chá e das torradas na testa...
Como uma desgraça nunca vem só também a mim me diagnosticaram um caso grave de sensibilidade dentária, associado a uma raiz mal extraída ou à suspeita de existência de uma cárie "daquelas misteriosas, que nem o Raio X detecta". Ou seja, não sabem porque é que dói.
Estamos em processo de investigação. Eu, e a minha dentadura. Que é só minha, natural. Tenho 62 anos e aqui cheguei sem uma única cárie, nem um dente chumbado .
Claro que deste segundo mistério nada digo em casa à "santa". Porque a resposta seria só uma :
- "Deus não dorme! É bem feito!"
Olhem que pôrra compadres!
segunda-feira, fevereiro 06, 2017
Nomenclaturas
As antigas classificações dos vinhos de mesa costumavam ser esclarecedoras. Tínhamos as Regiões Demarcadas. E dentro delas havia o Branco e o Tinto. E depois o Verde. Este podia ser branco ou tinto também.
O que melhor classificava o vinho do ponto de vista do consumidor era o produtor. Produtor de confiança era regra de ouro na compra. Grandes marcas se fizeram desta maneira ( e assim morreram algumas também). A atual hegemónica Sogrape é um bom exemplo do que herdou à conta da fama da clássica Ferreirinha.
Depois começámos a ler nas garrafas as palavras Reserva , ou Garrafeira. A Sociedade de Vinhos Borges tinha até nos topos de gama dos anos 70 o adjectivo "Frasqueira".
E a seguir foi uma desbunda completa: Aos rótulos anteriores acrescentaram-se: Colheita Seleccionada, Escolha Pessoal, Reserva dos Sócios, Selecção Especial, Superior. E muito recentemente os vinhos com designação de "Premium" também abundam...
Isto é só MKT ou também existe algum "substrato" que o cliente deve ter em atenção?
A lei (Portaria 239\2012) obrigava a que no rótulo se associasse a palavra "Garrafeira" a um vinho tinto com envelhecimento mínimo de 30 meses, dos quais 12 podem ser em garrafa. Será "Velha Reserva" se esse período for no mínimo de 3 anos.
As designações Colheita Seleccionada, Escolha, Reserva, Reserva Especial e Grande Reserva, previstas na lei, estão adstritas a vinhos de mesa com características organolépticas destacadas e que exibem teor de volume alcoométrico superior ( em 1% , noutros casos em 0,5%) ao limite mínimo fixado para o ano em causa
Ajudei? Se calhar não... Mas dou aqui dois exemplos alentejanos.
A Adega Cooperativa de Borba (uma grande casa, em todos os sentidos) comercializa o Grande Reserva Ouro de 2011 (14 graus) a 25 euros ; o Reserva de 2011, clássico rótulo de cortiça de 13,5 graus, a 9,90 euros; e o Premium de 2011, 14,5 graus também , a cerca de 6 euros.
Já bebi de todos. E qual gostei mais? Do mais caro. Teve 18,5 \20 na classificação da Revista de Vinhos. Mas atenção que o Premium mereceu , na mesma revista, 16,5\20! E reparem na diferença de preços... Comparando em termos absolutos, salte o Grande Reserva para quem pode. Mas ...em termos relativos? Venha de lá o Premium!
A Amareleza Vinhos (Companhia de Vinhos da Amareleja) tem uma marca chamada "Courelas de Pias" que faz Vinho do ano, Reserva e Premium. Neste caso a ordem de preços é essa mesmo.
Na feira de Vinhos do Continente foi possível testemunhar o seguinte: O Premium de 2015 tem 14 graus, custa mais caro, 2,99 euros (mas estava marcado a 9,99 euros!!) ) e é muito bom para o preço, um vinho gastronómico que baste. O Reserva de 2013 custa cerca de 2,90 euros (marcado a 6,99 euros fora de feira). Tem 13,5 graus e é um honesto, honestíssimo produto. E o vinho do ano (com um belo melro no rótulo) tem 12,5 graus, custa ainda menos do que o Reserva , cerca de 2,50 euros, e bebe-se muito bem, sem exageros de "bondade".
Qual gostei mais? Do mais "caro". Que também é o de mais elevado grau álcool. Sempre de comprar, até porque a diferença de preços para o Reserva foi na prática de 50 cêntimos!
Mas se a diferença de preços fosse de 3 euros em garrafa , dos 7 para os 10? Já pensaria...
E qual o lugar do vinho do ano nesta escolha? Durante a feira de vinhos, mais vale não o terem à venda.. A qualidade não justifica a escolha , pelo preço comparativo que encontramos entre estas 3 garrafas. E fora da feira? Assim sim. Estamos a falar de 2,5 euros a comparar com 7 e 10 euros.
Conclusão: Na dúvida e se puderem, vão pelo mais caro. Que pôrra de conselho Compadres...
O que melhor classificava o vinho do ponto de vista do consumidor era o produtor. Produtor de confiança era regra de ouro na compra. Grandes marcas se fizeram desta maneira ( e assim morreram algumas também). A atual hegemónica Sogrape é um bom exemplo do que herdou à conta da fama da clássica Ferreirinha.
Depois começámos a ler nas garrafas as palavras Reserva , ou Garrafeira. A Sociedade de Vinhos Borges tinha até nos topos de gama dos anos 70 o adjectivo "Frasqueira".
E a seguir foi uma desbunda completa: Aos rótulos anteriores acrescentaram-se: Colheita Seleccionada, Escolha Pessoal, Reserva dos Sócios, Selecção Especial, Superior. E muito recentemente os vinhos com designação de "Premium" também abundam...
Isto é só MKT ou também existe algum "substrato" que o cliente deve ter em atenção?
A lei (Portaria 239\2012) obrigava a que no rótulo se associasse a palavra "Garrafeira" a um vinho tinto com envelhecimento mínimo de 30 meses, dos quais 12 podem ser em garrafa. Será "Velha Reserva" se esse período for no mínimo de 3 anos.
As designações Colheita Seleccionada, Escolha, Reserva, Reserva Especial e Grande Reserva, previstas na lei, estão adstritas a vinhos de mesa com características organolépticas destacadas e que exibem teor de volume alcoométrico superior ( em 1% , noutros casos em 0,5%) ao limite mínimo fixado para o ano em causa
Ajudei? Se calhar não... Mas dou aqui dois exemplos alentejanos.
A Adega Cooperativa de Borba (uma grande casa, em todos os sentidos) comercializa o Grande Reserva Ouro de 2011 (14 graus) a 25 euros ; o Reserva de 2011, clássico rótulo de cortiça de 13,5 graus, a 9,90 euros; e o Premium de 2011, 14,5 graus também , a cerca de 6 euros.
Já bebi de todos. E qual gostei mais? Do mais caro. Teve 18,5 \20 na classificação da Revista de Vinhos. Mas atenção que o Premium mereceu , na mesma revista, 16,5\20! E reparem na diferença de preços... Comparando em termos absolutos, salte o Grande Reserva para quem pode. Mas ...em termos relativos? Venha de lá o Premium!
A Amareleza Vinhos (Companhia de Vinhos da Amareleja) tem uma marca chamada "Courelas de Pias" que faz Vinho do ano, Reserva e Premium. Neste caso a ordem de preços é essa mesmo.
Na feira de Vinhos do Continente foi possível testemunhar o seguinte: O Premium de 2015 tem 14 graus, custa mais caro, 2,99 euros (mas estava marcado a 9,99 euros!!) ) e é muito bom para o preço, um vinho gastronómico que baste. O Reserva de 2013 custa cerca de 2,90 euros (marcado a 6,99 euros fora de feira). Tem 13,5 graus e é um honesto, honestíssimo produto. E o vinho do ano (com um belo melro no rótulo) tem 12,5 graus, custa ainda menos do que o Reserva , cerca de 2,50 euros, e bebe-se muito bem, sem exageros de "bondade".
Qual gostei mais? Do mais "caro". Que também é o de mais elevado grau álcool. Sempre de comprar, até porque a diferença de preços para o Reserva foi na prática de 50 cêntimos!
Mas se a diferença de preços fosse de 3 euros em garrafa , dos 7 para os 10? Já pensaria...
E qual o lugar do vinho do ano nesta escolha? Durante a feira de vinhos, mais vale não o terem à venda.. A qualidade não justifica a escolha , pelo preço comparativo que encontramos entre estas 3 garrafas. E fora da feira? Assim sim. Estamos a falar de 2,5 euros a comparar com 7 e 10 euros.
Conclusão: Na dúvida e se puderem, vão pelo mais caro. Que pôrra de conselho Compadres...
segunda-feira, janeiro 30, 2017
Bagos de Arroz
Num destes dias foi possível investigar a nova casa do Chef Henrique Mouro, na Rua António Maria Cardoso, quase em frente à entrada do Centro Nacional de Cultura e ao Teatro de S. Luis, no Chiado.
Henrique Mouro começou no Pestana Palace, aprendendo o ofício com esse grande mestre que é Aimé Barroyer. Passou depois pelo Assinatura, pelo Tavares e pela Bica do Sapato.
Após uma pausa reflexiva dedicou-se a um conceito interessante nesta sua nova casa do Chiado: tudo leva arroz, desde as entradas ao prato principal e a algumas sobremesas. Daí o nome de "Bagos". Mas não se assustem! O arroz é extremamente discreto e nunca contribui para desviar a atenção do mais importante.
A casa é pequena (35 lugares sentados), mas muito bem decorada. Utensílios a preceito. Bons copos e o mais que se usa nestas azafamas. O andar de cima servirá mais para esperar pela mesa e ir tomando uns aperitivos, enquanto que é no andar de baixo que se passa a acção . Com a cozinha à mostra, como sempre gosto de ver.
Neste tipo de preparações culinárias - que se convencionou chamar "de influência francesa", ou ainda "cozinha com assinatura" - já sabemos que a decoração e a apresentação de cada prato contam muito, quase tanto como o paladar. De tal forma que alguns cultores do género confundem a Nuvem por Juno e trocam a prioridade que é devida aos sentidos neste enquadramento : primeiro o gosto e o olfacto, depois a vista.
Não é o caso de Henrique Mouro. A sua comida é muito bem apresentada, mas o que ressalta do quadro final é a qualidade do produto e a combinação de sabores aprimorada. Como deve ser.
As vanguardas culinárias das "espumas" ou de "vulcões em erupção à mesa" não se encontram ali.
Existe um Menu Executivo que começa a 12 euros (!) aos almoços. Mas podemos provar um menu mais completo por cerca de 15 euros, vinhos à parte, com entrada, prato principal e sobremesa. Ou podemos colocar-nos na mão do chef, se estivermos dispostos a gastar mais.
Os pratos principais , em média, valem 20 euros e são de dimensão adequada. Não se trata de "amostras".
Nesse dia pedimos inspiração ao chef, e preferimos ir pelas suas recomendações. Comeu-se (melhor dito, provou-se, porque eram várias propostas): perdiz de escabeche (sem perder a matriz foi admirável de contenção no vinagre), um glutinoso de bacalhau (perfeito), arroz de cogumelos selvagens com lebre (muito bom), choco frito com arroz de ostras (soberbo o arroz, menos bem o choco, que se queria mais "estrelicado"). E à sobremesa, arroz doce escondido num praliné muito bem feito.
Vinhos foram vários: começou-se com um flute de espumante bairradino, depois o Bacalhoa Branco de 2015 (que não faz esquecer o de 2014), seguiu-se o enorme Dão de Encruzado Quinta das Marias Reserva de 2011 e em tintos, o Douro Vallado Vinhas Centenárias, 2014 (claro que é bom, mas não encantou).
Levou a palma o Dão branco: gordo e guloso, cor magnífica denotando o envelhecimento nobre, bouquet que nunca mais acaba. Haverá imbecis que o vão recusar por "estar passado". Que sejam muitos e que vivam muitos anos, é o meu desejo, para ver se sobram para mim mais algumas dessas garrafitas.
Com tudo incluído (incluindo uma DOC Lourinhã XO Quinta do ROL) ficou a despesa por cerca de 80 euros por cabeça. A culpa foi dos líquidos!
Fora a água, coitada, que nada teve a ver com o assunto...
Uma bela casa, um grande chef (quase o Nuvem Vermelha!). Recomendado para todos. Mesmo para os que normalmente se refugiam na cozinha tradicional portuguesa, como é o meu caso. Porque não deve o Rei comer só Galinha, nem só Rainha (salvo seja).
Henrique Mouro começou no Pestana Palace, aprendendo o ofício com esse grande mestre que é Aimé Barroyer. Passou depois pelo Assinatura, pelo Tavares e pela Bica do Sapato.
Após uma pausa reflexiva dedicou-se a um conceito interessante nesta sua nova casa do Chiado: tudo leva arroz, desde as entradas ao prato principal e a algumas sobremesas. Daí o nome de "Bagos". Mas não se assustem! O arroz é extremamente discreto e nunca contribui para desviar a atenção do mais importante.
A casa é pequena (35 lugares sentados), mas muito bem decorada. Utensílios a preceito. Bons copos e o mais que se usa nestas azafamas. O andar de cima servirá mais para esperar pela mesa e ir tomando uns aperitivos, enquanto que é no andar de baixo que se passa a acção . Com a cozinha à mostra, como sempre gosto de ver.
Neste tipo de preparações culinárias - que se convencionou chamar "de influência francesa", ou ainda "cozinha com assinatura" - já sabemos que a decoração e a apresentação de cada prato contam muito, quase tanto como o paladar. De tal forma que alguns cultores do género confundem a Nuvem por Juno e trocam a prioridade que é devida aos sentidos neste enquadramento : primeiro o gosto e o olfacto, depois a vista.
Não é o caso de Henrique Mouro. A sua comida é muito bem apresentada, mas o que ressalta do quadro final é a qualidade do produto e a combinação de sabores aprimorada. Como deve ser.
As vanguardas culinárias das "espumas" ou de "vulcões em erupção à mesa" não se encontram ali.
Existe um Menu Executivo que começa a 12 euros (!) aos almoços. Mas podemos provar um menu mais completo por cerca de 15 euros, vinhos à parte, com entrada, prato principal e sobremesa. Ou podemos colocar-nos na mão do chef, se estivermos dispostos a gastar mais.
Os pratos principais , em média, valem 20 euros e são de dimensão adequada. Não se trata de "amostras".
Nesse dia pedimos inspiração ao chef, e preferimos ir pelas suas recomendações. Comeu-se (melhor dito, provou-se, porque eram várias propostas): perdiz de escabeche (sem perder a matriz foi admirável de contenção no vinagre), um glutinoso de bacalhau (perfeito), arroz de cogumelos selvagens com lebre (muito bom), choco frito com arroz de ostras (soberbo o arroz, menos bem o choco, que se queria mais "estrelicado"). E à sobremesa, arroz doce escondido num praliné muito bem feito.
Vinhos foram vários: começou-se com um flute de espumante bairradino, depois o Bacalhoa Branco de 2015 (que não faz esquecer o de 2014), seguiu-se o enorme Dão de Encruzado Quinta das Marias Reserva de 2011 e em tintos, o Douro Vallado Vinhas Centenárias, 2014 (claro que é bom, mas não encantou).
Levou a palma o Dão branco: gordo e guloso, cor magnífica denotando o envelhecimento nobre, bouquet que nunca mais acaba. Haverá imbecis que o vão recusar por "estar passado". Que sejam muitos e que vivam muitos anos, é o meu desejo, para ver se sobram para mim mais algumas dessas garrafitas.
Com tudo incluído (incluindo uma DOC Lourinhã XO Quinta do ROL) ficou a despesa por cerca de 80 euros por cabeça. A culpa foi dos líquidos!
Fora a água, coitada, que nada teve a ver com o assunto...
Uma bela casa, um grande chef (quase o Nuvem Vermelha!). Recomendado para todos. Mesmo para os que normalmente se refugiam na cozinha tradicional portuguesa, como é o meu caso. Porque não deve o Rei comer só Galinha, nem só Rainha (salvo seja).
segunda-feira, janeiro 23, 2017
Sobrecarga sensorial
Estava prometida uma prova vertical de alguns vinhos do Reno da casta Riesling. O nosso amigo alemão trouxe preciosidades na mala e nada como um encontro à sombra do bom marisco português, no Beira Mar, para testar aquelas garrafas.
Convém dizer que a doçura deste tipo de vinhos (do menos doce para o mais doce : Kabinett, Spätlese, Auslese) não se deve à existência da podridão nobre (Botrytis) como é habitual nos nossos "colheitas tardias", mas apenas à qualidade da uva, ao terroir e à arte do vinicultor. Chegados ao Eiswein, o último da lista em doçura, lá teremos a amiga Botrytis.
Naquela tarde beberam-se Riesling de 1989 até 2014, com preços a começar nos 60 euros por garrafa e a acabar nos mais de 1200 euros. De produtores conceituadíssimos, com relevo para o Sr. Döhnoff, de Oberhausen (Nahe) o único produtor alemão a ter conseguido 100 pontos por 5 vezes, com diferentes vinhos seus, na "bíblia" do Sr. Robert Parker.
Para complementar beberam-se ainda dois vinhos do amigo Bernd Philippi. Um Campo Ardosa de 2004 - e que foi o único tinto em prova. E o famoso "A" Riesling. Um vinho seco admirável que se provou em garrafa de experiência e que não se sabe ainda quando vai ser vendido ou quanto custará, mas a estimativa de preço é superior aos 2500 euros.
Faço notar que o grau álcool destes grandes vinhos alemães é muito baixo. Embora na garrafa estejam referências de 10 graus, alguns deles terão até menores graduações. Por norma quanto mais doce menos grau, com os grandes vinhos secos a atingirem a "enormidade" de 13 graus.
A sobrecarga sensorial foi tremenda. Passámos dos vinhos mais "novos" e "baratos" para os mais complexos ( e caros), sendo que os cheiros e sabores a maçãs maduras e citrinos foram prevalecentes nos vinhos mais novos e simples, deixando-se os frutos secos e até o doce-amargo da toranja para os mais complexos. Todos muito bons!
Convém dizer que a doçura deste tipo de vinhos (do menos doce para o mais doce : Kabinett, Spätlese, Auslese) não se deve à existência da podridão nobre (Botrytis) como é habitual nos nossos "colheitas tardias", mas apenas à qualidade da uva, ao terroir e à arte do vinicultor. Chegados ao Eiswein, o último da lista em doçura, lá teremos a amiga Botrytis.
Naquela tarde beberam-se Riesling de 1989 até 2014, com preços a começar nos 60 euros por garrafa e a acabar nos mais de 1200 euros. De produtores conceituadíssimos, com relevo para o Sr. Döhnoff, de Oberhausen (Nahe) o único produtor alemão a ter conseguido 100 pontos por 5 vezes, com diferentes vinhos seus, na "bíblia" do Sr. Robert Parker.
Para complementar beberam-se ainda dois vinhos do amigo Bernd Philippi. Um Campo Ardosa de 2004 - e que foi o único tinto em prova. E o famoso "A" Riesling. Um vinho seco admirável que se provou em garrafa de experiência e que não se sabe ainda quando vai ser vendido ou quanto custará, mas a estimativa de preço é superior aos 2500 euros.
Faço notar que o grau álcool destes grandes vinhos alemães é muito baixo. Embora na garrafa estejam referências de 10 graus, alguns deles terão até menores graduações. Por norma quanto mais doce menos grau, com os grandes vinhos secos a atingirem a "enormidade" de 13 graus.
A sobrecarga sensorial foi tremenda. Passámos dos vinhos mais "novos" e "baratos" para os mais complexos ( e caros), sendo que os cheiros e sabores a maçãs maduras e citrinos foram prevalecentes nos vinhos mais novos e simples, deixando-se os frutos secos e até o doce-amargo da toranja para os mais complexos. Todos muito bons!
terça-feira, janeiro 17, 2017
Nos subúrbios uma boa nova
Tive de ir em trabalho à Ramada. Uma das antigas sete freguesias do Concelho de Odivelas, por onde andou D. Dinis a brincar no Convento - e tanto gostou que lá ficou até hoje.
Chegado à hora de almoçar comecei a procurar poiso adequado. Sem vislumbre de dica iniciática dos peritos em gastronomia encartados acabei por apear à beira da estrada no:
Churrasqueira D. Pedro
R. Álvaro de Campos 40, 2620-271 Ramada
21 829 1482
Belo restaurante com grelha à vista, pratos do dia muito bem apresentados e uma interessante carta de vinhos, pois dobra a vocação como garrafeira. Simples, mas não atascado no sentido boçal do termo.
Tem Bacalhau do antigo, isto é, demolhado em casa, e que por isso mesmo pode ser servido ao cliente em posta do rabo (com vossa licença) ou da cabeça. Só por esse motivo já merecia visita.
Mas depois também tem um serviço conhecedor e amável, qualidade de carnes grelhadas garantida, preços maneirinhos e a tal lista de vinhos cuidada em todos os aspectos.
Com uma garrafa de Tinto Carlos Reynolds (da família do Mouchão) de 2013, bacalhau com grão e todos os acompanhamentos, prato de salpicão alentejano e queijo de igual proveniência, e ainda 2 cafés e Jameson Cask Reserve para um, pagaram duas pessoas 32 euros.
Tem cozido à quarta feira e ao domingo. E irei experimentar. Pois vale bem a pena a deslocação, como diria o inspector do "Miquelino".
Chegado à hora de almoçar comecei a procurar poiso adequado. Sem vislumbre de dica iniciática dos peritos em gastronomia encartados acabei por apear à beira da estrada no:
Churrasqueira D. Pedro
R. Álvaro de Campos 40, 2620-271 Ramada
21 829 1482
Belo restaurante com grelha à vista, pratos do dia muito bem apresentados e uma interessante carta de vinhos, pois dobra a vocação como garrafeira. Simples, mas não atascado no sentido boçal do termo.
Tem Bacalhau do antigo, isto é, demolhado em casa, e que por isso mesmo pode ser servido ao cliente em posta do rabo (com vossa licença) ou da cabeça. Só por esse motivo já merecia visita.
Mas depois também tem um serviço conhecedor e amável, qualidade de carnes grelhadas garantida, preços maneirinhos e a tal lista de vinhos cuidada em todos os aspectos.
Com uma garrafa de Tinto Carlos Reynolds (da família do Mouchão) de 2013, bacalhau com grão e todos os acompanhamentos, prato de salpicão alentejano e queijo de igual proveniência, e ainda 2 cafés e Jameson Cask Reserve para um, pagaram duas pessoas 32 euros.
Tem cozido à quarta feira e ao domingo. E irei experimentar. Pois vale bem a pena a deslocação, como diria o inspector do "Miquelino".
segunda-feira, janeiro 09, 2017
O dia de todos os funerais e mais um
Morrem por dia em Portugal quase 300 pessoas. São os dados oficiais. Mas é claro que poucos destes funerais têm tanto impacto na opinião pública do que aqueles a que assistiremos hoje: os de Mário Soares, Daniel Serrão, Guilherme Pinto. E, para mim, o do Carlos Bernardo.
Estive perto de Mário Soares várias vezes, em momentos institucionais que tinham a ver com a minha função. Recordo dele tiradas impagáveis, mandando afastar ministros quando manuseava o carimbo, dizendo que "...disto percebo eu Sr. Ministro!". E outras "estórias" que um dia (depois da reforma) poderei contar com mais à vontade. À família - especialmente a João Soares, que esteve connosco, também ele carimbando - os meus sentimentos sinceros.
Do Professor Daniel Serrão a minha memória é mais difusa, indo buscar apenas um momento de contracena com as emissões de selos, mas como espectador, segundo me recordo na Câmara Municipal do Porto. Todavia com o filho Manuel Serrão tenho-me encontrado diversas vezes, em sessões em redor do património gastronómico nacional e a ele envio um sentido abraço de condolências.
Guilherme Pinto foi um dos atores presenciais, a 31 de Outubro do ano passado, na sessão da Fábrica Ramirez onde lançámos a 1ª emissão de selos do mundo em latas de conserva. Carimbou os sobrescritos de 1º dia e proferiu algumas palavras, já bastante debilitado. Aproximei-me dele porque o vi sentado (era o único em cadeira) e logo me disse sem problemas: "estou sentado porque tenho um cancro. Mas vou dar-lhe a volta!". À Câmara Municipal de Matosinhos, a todos os parentes e amigos, vai igualmente daqui um abraço de pêsames.
E depois o Carlos Bernardo. O Carlos trabalhou na Filatelia dezenas de anos. Entrámos quase ao mesmo tempo para os CTT, tendo feito o tirocínio naquela escola de correios que foi a Casal Ribeiro. Almoçávamos praticamente todos os dias juntos.
A equipa da altura tinha pouca gente, mas de muita qualidade: O Leiria Viegas ao leme, o Duran nos desenhos, a Graciete no ramo internacional, a Manuela e a Julieta na "fábrica", a Sacramento Costa no Planeamento e depois o Carlos Bernardo ( e eu) na área Comercial.
O Carlos era um homem bom. Nunca conheci alguém que não gostasse dele. Tinha uma forma jovial de encarar o mundo e a vida de trabalho. Era um dos melhores colegas nos momentos bons e maus.
Nestes mais de 30 anos de companheirismo , lado a lado na mesma sala e depois em gabinetes contíguos, recordo histórias muito engraçadas passadas com ele.
Uma vez foi a Israel fazer uma exposição. Convém dizer que o aspecto físico do Carlos era quase árabe: baixo, muito moreno, de cabelo preto encaracolado.
Desta forma antes de o deixarem entrar em Tel-Aviv meteram-no numa sala e mandaram-no despir todo. O Carlos assim fez, mas deixara as peúgas calçadas. "Tire sff as meias!". E ele lá tirou. E veio-nos dizer para Lisboa: " Mas onde raio caberia uma bomba debaixo dos peúgos? Imaginem se eu usasse meias até ao joelho...ainda lá estava!"
De outra vez partimos de Renault 4 (mudanças de "bengala") para uma reunião no Algarve, penso que era no Carvoeiro. Estávamos no Verão. As mais de 4 horas de viagem - a viatura fazia 100Km \hora em descidas - fizeram-nos uma sede do caneco. Chegados ao Hotel rumámos ao Bar e enfiámos de seguida quatro gins tónicos cada um. Estávamos à vontade, porque a nossa intervenção era lá mais para o final da tarde e tínhamos umas horas para recuperar.
Mas depois da desbunda soubemos que tinha havido mudanças e éramos os primeiros a falar. Dentro de 20 minutos começava a sessão.
O que fizémos? Para saber qual dos dois tinha a honra de se dirigir à assembleia primeiro, fomos beber mais um Gordon's e deitámos uma moeda ao ar. Perdi eu...
No fim das intervenções, antes do jantar, o Leira Viegas veio ter comigo e disse-me "Você estava muito animado! Pôs a malta toda a rir". Pois ...
Era assim o meu Amigo. Recordo-o já com saudade, nos grandes momentos de convívio que tivemos juntos. Algarvio de gema, sempre que podia rumava a sul. E eu com ele várias vezes. Conhecíamos de cor a Estrada Nacional 5, sobretudo no troço entre Portimão e Vilamoura... Chegámos a fazer na mesma noite esse troço umas 4 vezes (duas para cada lado). Grandes tempos!
Boa Viagem Amigo! E falaremos.
quinta-feira, janeiro 05, 2017
2017
Fiquei com problemas de acesso internáutico no final do ano passado, a que se juntou uma arrelia (e avaria) com o telemóvel que obrigou à respectiva substituição.
Por isso me penitencio de tão longa ausência.
O ano começou bem, com o Engº Guterres na ONU, com o Governo equilibrado na sua geringonça e com o SLB bem estribado no futebol pátrio (esta foi para chatear os amigos verdes e azuis).
O vosso Blogger enfartou de cozinheiro de serviço à quadra e agora está em greve de zelo. Comam sopas do Tio Belmiro, frangos do amigo galego, sandes de presunto e tapas de salmão. Ovos mexidos se me comovo...E vá lá que ainda ponho a mesa, levanto os pratos e lavo a louça...
A mais velha das minhas santas já se queixou que a estão a "matar à fome". Falta-lhe comida de garfo e faca. Pois, a mim também me falta muita coisa. E não é só o que vocês estão a pensar!
Falta-me ganhar o euromilhões (prometido há anos), falta-me descanso numa praia onde o trabalho mais duro seja mergulhar na água a 20º, falta-me a continuação do Game of Thrones. E por aí fora, não desejando entrar nas "faltas" de cariz mais mundano-carnal.
O que desejo para 2017 é simples:
- Mais saúde, mais emprego, mais dinheiro para trocos, mais tempo para amar.
- Paz no mundo e água potável para todos (humanos, animais e plantas), Vinho do melhor (para quem sabe apreciar). Que nunca nos falte a alegria nem a capacidade de criticar.
- Muitos anos de vida aos Media Streamers! Graças à NetFlix (e outros) deixámos definitivamente para trás a TV paleolítica onde ainda "florescem" coisas mal cheirosas como a Reality TV...
- Desejo livros bons e em quantidade. Desejo museus modernos e cheios de malta nova.
E sobretudo desejo bom senso para cuidar do ambiente, boas práticas sustentáveis no comércio e na indústria, mais e melhor protecção das árvores, da floresta, dos rios e dos mares. E da vinha... da vinhazinha pôrra! Cuidado com as barragens!
Em que planeta? Perguntarão vocês...
Neste, está claro. Por enquanto não temos outro...
Embora às vezes pareça...
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