quarta-feira, fevereiro 24, 2016

A Idade



Estou sem escrever aqui há dois dias em consequência de ter estado mais que ocupado com a saúde  da  minha "santa" cá de baixo. Não dou detalhes, porque não concordo em fazer deste local espelho de alma ou muro de lamentações.

Sempre tive a convicção que os bons momentos são para partilhar e os maus momentos são íntimos, para interiorizar. Mas aproveito a oportunidade para escrever sobre a "idade" e sobre a forma como a mesma nos vai afectando.

"Je suis incapable de concevoir l'infini et pourtant je ne puis pas  accepter le fini.  Je veux que cette aventure qui est ma vie ne termine jamais."
Simone de Beauvoir

À medida que vamos "entrando na idade"  a vida modifica-se.  Em qualquer das diferentes idades: na idade adulta, na idade média , na idade da sabedoria e na idade da bengala ou do  andarilho.

Não existem regras sobre quem entra,  como entra,  nem quando...Eu próprio por vezes tenho dúvidas sobre se já entrei na idade "adulta" (sobretudo de manhã ou ao almoço) mas quando acaba o dia sinto-me como se estivesse na fronteira da "sabedoria" para a "bengala", dependendo de como a ciática me tratou.

Dizem os americanos - peritos em listas e classificações - que nos tempos que correm a idade adulta atinge-se quando o jovem se estabelece por conta própria (sai de casa dos pais e tem emprego que lhe permite subsistir sozinho), a idade média será quando viu os filhos entrarem na Universidade (ou estarem empregados), a idade da sabedoria  ocorre quando fazemos saltar no colo os primeiros netos e, finalmente, a idade da bengala , será quando perdemos mais tempo nas salas de espera dos médicos e dos hospitais do que em outras actividades .

Se tivermos que pensar em anos seria mais ou menos assim e tendo em conta as circunstâncias actuais que infelizmente restringem o "sistema" em Portugal: 30, 55, 70, 80 anos.

Quando eu comecei nestas andanças a declinação dos limites anuais era diferente: Empreguei-me aos 21 anos, tive o filho aos 26 anos, este entrou na faculdade quando eu tinha 44. Netos é que nada ainda, pela incompetência do meu "senhorio". E bengala também já usei  e às vezes ainda uso quando a p*** da ciática aperta. Andarilhos é que por enquanto não (lagarto, lagarto) .

A forma como a nova geração vê a mais antiga também é influenciada por estes ritmos.  Vemos nos pais e mães formas de "vaca leiteira" (salvo seja),  para irmos esmifrando uns cobres em alturas de necessidade,  temos como garantido que eles (mais elas) tenham a disponibilidade para tomar conta dos netos e das casas.  Podemos dispor dos ensinamentos e da experiência em coisas tão diferentes como tratar dos arranjos em casa , orientarem a empregada, ensinarem a cozinhar ou ajudarem a compor um texto de carta para qualquer situação.

Até que chega o momento em que a situação se volta do avesso. A nova geração deixa de poder contar com a antiga para muitas dessas coisas, e, pelo contrário, tem de passar a dar parte daquilo que recebeu. E somos felizes quando temos tempo suficiente para "eles" receberem pelo menos tanto quanto nos deram.

 Começam estas andanças da última fase pela  mobilidade comprometida, e em consequência os nossos  idosos passam a vida em casa, com medo de saírem e caírem na rua. E continua inexoravelmente até que pode chegar a fase em que já não podem estar sozinhos.

Modernamente e graças aos avanços na geriatria em geral, com relevo pela prevenção cardiovascular, são cada vez mais os idosos que se encontram vivos mas dependentes. E para estes a sociedade ainda não  encontrou solução.

Acabaram as grandes famílias onde havia sempre em casa acompanhantes que não trabalhavam e que tinham como responsabilidade cuidar dos mais velhos.  Se estes forem ricos têm à disposição empregados dedicados ou lares de acolhimento decentes, se forem remediados ou pobres o panorama pode ser de fugir...

Pelo que faço minhas as palavras do povo : "até para morrer é preciso ter sorte".

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