Amigos e conhecidos muitas vezes respondem à nossa delicada pergunta " Como vai isso?" com a resposta típica do lusitano meio quilhado com a vida: "Cá vamos vivendo, obrigado..."
O "ir vivendo" , numa tradução livre do pensar e do sentir de quem fala assim, deve significar mais ou menos isto:
- "Olhe, muito obrigado por ter perguntado. Falta dinheiro para gastar e trazer qualidade à minha vida. O miúdo precisa de óculos e de livros para a escola, a minha sogra queixa-se dos preços dos medicamentos e dos médicos, a patroa e eu já não vemos a cor de uma cadeira de cinema há mais de um ano. E tive de reduzir a TV Cabo ao mínimo possível."
"Ir vivendo" é mais "Ir sobrevivendo". Significa ter de abdicar dos pequenos prazeres da vida para nos concentrarmos naquelas despesas que são obrigatórias e imprescindíveis. Significa que já não há espaço para o supérfluo na nossa vida.
Talvez seja mal comparado, mas não posso deixar de pensar que esta situação tem semelhanças com o que se passa com a Arte, a Ciência e a Cultura, que são quem mais sofre em alturas de aperto financeiro dos países. Tem de haver dinheiro para a assistência social, para as escolas, para o fundo de desemprego. As Artes podem esperar. A Ciência não é prioridade. A Cultura é um luxo dos países ricos.
Não sei se todos compreendem o enorme perigo de nos deixarmos embalar por esta filosofia mercantilista?
A primeira coisa que devemos fazer é combater o preconceito de que, pelo facto das
necessidades serem tantas, não há espaço para a ciência, cultura e a arte. Isso é um
equívoco monumental. A ciência, a cultura e a arte são elementos de convivência e estimulam
as inovações. Não se trata de estabelecer prioridades. Há uma série de esferas
da acção pública e da acção privada que precisam de ser enfrentadas ao mesmo tempo. E
a ciência, a cultura e a arte estão entre elas.
Foi feita uma petição pública sobre esta matéria no início de 2014, cujo texto não pode estar mais actual. Leiam aqui sff:
http://peticaopublica.com/pview.aspx?pi=manifestocontracrise
"A política cultural deve ser um vector decisivo na construção do modelo de desenvolvimento contemporâneo de uma nação. Arte, ciência e cultura são essenciais aos sistemas de inovação de uma sociedade. A sua força simbólica e dinâmica económica produzem aprofundamento da cidadania, qualificação de ambientes sociais, sustentabilidade, respeito pela diversidade e redução de níveis de violência direta. É através dos valores culturais que cada pessoa desenvolve o seu reconhecimento próprio e o seu lugar na sociedade."
Não fui eu que o disse. Está nos programas de desenvolvimento da ONU...
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