terça-feira, abril 15, 2014

Ir às Hortas para Odivelas

Hoje haverá uma cerimónia na Câmara Municipal de Odivelas, comemorando o 25 de Abril. E eu lá estarei com a minha habitual "caixa" dos carimbos em prata, exibindo um carimbo que será colocado em cima da série de selos do "25 de Abril - 40 Anos" e com vários exemplares do livro homónimo que o Prof. Costa Pinto escreveu para nós.

Que maravilha podermos celebrar este dia! Para quem ainda desmerece das conquistas de Abril nada como reler o excelente artigo de Vasco Pulido Valente sobre a "pobreza do Estado Novo" escrito no "Público".

Há 40 anos o que era Odivelas? E no dealbar do Estado Novo? E antes disso?

Raul Proença  (em 1924) estigmatizava de forma violenta os habitantes dos "arrabaldes" de Lisboa:

"Quando Afonso Henriques tomou posse de Lisboa, consentiu-se ao mouro que refluísse para os subúrbios da cidade, e ele aí se estabeleceu, entregue ao cultivo das hortas, com a água a escorrer da nora generosa. É desta população consentida, mourisca e subalterna, que deriva o mais da gente que habita os contornos de Lisboa - o Saloio de tez morena, olhos e cabelos negros e castanhos, pele tisnada, membros secos, tipo sem finura de raças ou beleza plástica de linhas..."

Esqueceu-se foi de acrescentar que era essa "gente" sem finura de traços que alimentava Lisboa, que dava de comer aos "outros" belos e robustos do Norte, se calhar demasiado altos para se curvarem sobre a enxada.

Odivelas (com Loures, Amadora\Porcalhota, Sintra e Mafra à mistura) era há muitas dezenas de anos atrás uma zona de belas quintas rurais, onde para além dos lavradores e seus apêndices, existiam as antigas profissões da "lavadeira", "almocreve", "moleiro" e o inevitável "carroceiro", do qual se contavam anedotas mil.

Toda esta gente se encontrava às Portas de Benfica , local onde se efectuava a pesagem dos produtos que entravam na cidade.

(Atenção que não era às Portas de Alvalade! Nessa altura Alvalade era um couto - Quinta das Mouras -  do Sr. Visconde do mesmo nome).

O Instituto Feminino de Educação e Trabalho (protótipo do Instituto de Odivelas) foi ali fundado em 1900, e logo 12 anos depois era lá professora a grande Adelaide Cabete, médica e escritora, uma das mais importantes figuras femininas do século XX em Portugal.

Mas antes, muito antes disto tudo, Odivelas era terra arável, água e hortas.

 Odivelas é também o local de repouso do grande Rei D. Dinis, o rei iniciado. 

Dizem que a D. Dinis e aos seus hábitos lascivos se deve o nome da Vila. Parece que visitava ali muitas jovens do seu agrado, pela noitinha. A Rainha Santa  Isabel  uma vez  fez-lhe uma espera com as suas damas e gritou-lhe  "Ide vê-las Senhor, Ide vê-las!"

Feliz teria D. Dinis sido naquele lugar, porque ali quis ser enterrado.

No seu repouso terreno -  o Mosteiro de S. Dinis e S. Bernardo de Odivelas - as Madres sempre trabalharam bem nos fornos e nas panelas, tendo ali ao pé avultado fornecimento de ovos, e dádivas generosas de açucar:

"O Convento de Odivelas foi, sem dúvida, um dos que mais contribuiu para a doçaria de Portugal.
As suas especialidades em confeitaria e doçaria, fabricadas pelas freiras bernardas fizeram tradição. Destacam-se a célebre Marmelada de Odivelas, os Suspiros de Amêndoa, asRaivas, os Tabefes, os Esquecidos, o Toucinho do céu, entre outros."
Lembremo-nos a terminar da Madre Paula, famosa amiga especial de D. João V, que muitos favores alcançou para o Mosteiro.
Odivelas é terra boa, terra de prazeres terrenos e de gastronomia antiga. Vou gostar muito de ali celebrar o 25 de Abril 40 anos depois. Até porque foi ali - Quartel da Pontinha - que se baseou o Posto de Comando do MFA. 

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