segunda-feira, junho 12, 2006

O Regresso do Velho e Nobre Senhor



Restaurante "O Nobre" - Av. de Olivença (Junto à Praça de Touros do Montijo) - 21 231 75 11 Fecha às Terças Feiras.


Existirão restaurantes de luxo em Portugal?

Passo a explicar. No meu entendimento qualquer estabelecimento de restauração candidato ao título “Luxo”, seja em que lugar do mundo for, deve obrigatoriamente concentrar quatro características - uma cozinha acima de qualquer suspeita, um serviço primoroso, um décor compatível com os anteriores requisitos e, também, uma cave de vinhos que reúna não só as novidades de qualidade como também as “jóias da coroa” que fazem parte do património enológico dos mais conceituados países vinícolas.

A dificuldade em conciliar estes quatro aspectos fundamentais sem qualquer tipo de compromisso é por demais evidente. Basta pensar - e referimo-nos agora apenas ao caso português - no valor do investimento que qualquer empresa terá de efectuar para poder oferecer aos seus clientes vinhos tintos e brancos que constituam referências históricas das diversas regiões vinícolas. Neste investimento não podemos deixar de incluir as condições ideais de armazenamento dos mesmos vinhos, habitual “calcanhar de Aquiles” de muitos restaurantes que conhecemos.

Não queremos com isto dizer que se come mal em Portugal. Muito pelo contrário. Vivemos, graças a Deus, num país onde a média dos restaurantes é bastante aceitável. O problema está no facto de uma boa cozinha ou uma situação paisagística privilegiada não poderem, por si só, justificar o qualificativo “Luxo”.

Entre os "medalhados do Miquelino" e mais uma mão cheia de Casas (Fortaleza do Guincho, Carlton, Eleven, etc...) vai-se fazendo a história da Restauração de Luxo em Portugal. Vai-se fazendo de acordo com a dimensão da nossa pequenez (se me permitem) o próprio Tavares teve de encerrar aos Almoços por falta de Clientes , embora tenha por proprietário um rico senhor...

Mas com as histórias que se vão lendo deste "novos-ricos" por vezes esquecemo-nos de quem já lá esteve nesse "campeonato" , tudo viu e tudo fez - talvez demais.. - e agora regressa para nos dar de novo o Prazer de nos Servir.

Desde os tempos em que os actuais proprietários e gerentes do NOBRE - Sr. José Nobre e D. Justa - faziam escola de bem servir no antigo “Constituinte”, até à inauguração das novas instalações adjacentes à Praça de Touros do Montijo (a 20 minutos de Lisboa pela Vasco da Gama) , houve decerto um percurso de natural aperfeiçoamento mas também de luta e de angústias e de muito trabalhar para ver tudo a esvair-se por entre as mãos...

De facto por alturas da Expo e tentado por um Sócio que só via a ganância como objectivo, o Sr. Nobre chegou a gerir directamente 7 estabelecimentos de restauração em Lisboa e Cascais, com os resultados nefastos que todos conhecemos...

Hoje temos de novo uma Nobre Casa de Comer, graças ao investimento que foi feito na pesquisa documental de receituário português e na sua interpretação culinária prática. De facto Justa Nobre é uma das melhores cozinheiras que conheço.

O actual Nobre aposta também no requinte com que pretende brindar os clientes - decoração interior profissional; pratos, copos e talheres da mais alta qualidade; pessoal muito qualificado na recepção e no serviço à mesa.

A ementa com que nos tivemos de debater antes da refeição era extremamente completa, incluindo não menos de 14 sugestões de “pratos do dia”, para além de grupos heterogéneos de outras propostas gustativas - pratos lisboetas, especialidades da casa, peixes, carnes, doces e fruta. O Peixe, chegado todos os dias de Setúbal e de Sesimbra é de cair para o lado.

Nas diversas vezes em que tivemos ocasião de frequentar “O Nobre”, nesta como noutras encarnações, provámos pratos tão diversos na sua origem e complexidade de execução como migas de espargos verdes com entrecosto, lombos de robalo à Justa, perdiz à moda do Convento de Alcântara, lombo de garoupa de coentrada ou sopa de santola.

Nunca tivemos razões para contestar a competência da confecção e o rigor com que as receitas foram interpretadas. É esta cozinha, decididamente, talvez a melhor de Lisboa (enfim, da Grande Lisboa...) e uma das melhores do País.

A carta de vinhos sofre dos defeitos inerentes ao facto do restaurante que a apresenta ser relativamente novo. Isto é, possui todos os vinhos de qualidade brancos e tintos recentes. Faltam-lhe os clássicos...

Uma refeição composta pelas entradas tradicionais da casa (carapauzinhos de escabeche, mexilhão à espanhola, fígado de tamboril frito em escabeche, etc), seguidas por lombos de garoupa de coentrada e rematada por uma excelente sopa dourada - a mesma da “tia Vicência” de “A Cidade e as Serras” - foi acompanhada por um vinho branco excepcional mas, infelizmente, de distribuição quase confidencial e, por isso mesmo, muito difícil de encontrar, quer no comércio quer na restauração: Baron de B , Branco, 2004 da Quinta da Calada.

Ficou-nos esta refeição por cerca de 90€ para duas pessoas! Mas note-se que o vinho branco atrás citado é mais caro do que muitos tintos de qualidade que por aí andam...

Em conclusão, apenas faltam ao Restaurante “O Nobre” do Montijo amplas janelas viradas ao Tejo.

Quanto ao resto, qualidade gastronómica e serviço, não lhe daríamos como classificação cinco estrelas mas seis... se tal fosse possível.

Nenhum comentário: