segunda-feira, março 16, 2015

Comeres tradicionais da Raia

O Bucho da Guarda que comemos no Belo Horizonte levou-nos a falar com o proprietário (Sr. José) para discutir o que os clientes ainda pedem e continua a comer-se agora e o que deixou de ser cozinhado, embora fosse também tradicional.

Numa cidade onde os talhos  já servem ao passante os produtos da charcutaria espanhola (ali tão perto ) é de desconfiar que algumas das tradições tenham ido por água abaixo, por falta de "animação cultural".

A procura do tradicional e do antigo leva a situações que nem sempre são as mais desejáveis. Abundam as pequenas falcatruas. Algumas para fugir à regra da "origem controlada". Outras para continuar a fazer em casa o que é agora obrigatório ser feito em local inspeccionável pelas autoridades. O  Bucho e a magnífica Morcela de Sangue são bons exemplos.

A lei diz sobre o Bucho:

Entende-se por BUCHO DA GUARDA, o enchido fumado obtido a partir da carne da cabeça, rabo, costelas, cartilagens, osso da espinha, focinho e orelha de porcos de raça Bísara na sua linha pura ou de animais resultantes de cruzamentos, em que pelo menos um dos progenitores seja da raça suina Bísara, inscrito no respectivo Livro Genealógico.

Sem ter o bicho suíno morto à frente imagina-se que estas questões das genealogias bastas vezes fugirão ao "bísaro" e passem para o "chino" ...

O mesmo para o Queijo da Serra, onde a Guarda faz figura de chefe de fila (mesmo nos USA!) já que o seu distrito abrange os concelhos de Seia, Gouveia, Fornos de Algodres, Mêda e Sabugal. Grandes terras de ovelhas bordaleiras,  churras e de pastorícia milenar.  Todavia Covilhã, Tábua, Tondela. Trancoso e Viseu também têm freguesias certificadas.

Aqui a questão parece mais ser a de ter de pagar a certificação e a "coima" à Cooperativa, coisa que muitos pastores e pequenos produtores não desejam fazer, nem fazem...

Por isso é mais fácil apanhar grandes queijos da serra "fora da  mãe". Como em tudo, é preciso conhecer.

O uso da Denominação de Origem "Queijo Serra da Estrela - DOP" e "Queijo Serra da Estrela Velho - DOP" fica reservado aos produtos que obedeçam às características estipuladas no caderno de especificações, o qual inclui, designadamente, as condições de produção e conservação do leite, higiene da ordenha, fabrico do produto, o saneamento animal e a assistência veterinária, as substâncias de uso interdito, podendo ser utilizada apenas por produtores expressamente autorizados pelo Agrupamento, ESTRELACOOP - Cooperativa dos Produtores de Queijo Serra da Estrela, CRL., que se comprometam a respeitar todas as disposições do respectivo Caderno de Especificações e se submetam ao controlo a realizar pelo Organismo Privado de Controlo e Certificação - OPC - BEIRA TRADIÇÃO - Certificação de Produtos da Beira, Ld.ª.

Para mim, e nunca desdenhando do cabrito assado no forno de lenha, uma das iguarias mais mimosas que já comi em terras da "capeia arraiana" é a vitela do Jarmelo. Dizem que é derivada da Mirandesa, mas os pastos de altitude onde normalmente anda adoçam-lhe a carne e o exercício de andar sempre a subir e a descer a montanha faz repartir a gordura natural destes animais de forma uniforme.



No dia 27 de Abril de 2006, a Assembleia Municipal da Guarda declarou a Raça Bovina Jarmelista como de Interesse Municipal. Mais recentemente, após conclusão dos estudos e investigações iniciadas em 2004 pela Direcção Geral de Veterinária, em colaboração com a Associação de Criadores de Ruminantes do Concelho da Guarda, foi finalmente, em 27 de Outubro de 2007, reconhecida a Raça Bovina Jarmelista como Raça Autóctone Portuguesa.

Mesmo apenas grelhada nas brasas esta carne de vitela tem tudo para se tornar um ex-libris da Guarda e arredores. O problema é que para a apanhar no prato é preciso meter empenhos e fazer promessas à Virgem da Assunção (padroeira da cidade). Tentem telefonar ao Belo Horizonte e marcar.

E apesar da posta do lombo ser a parte nobre, nunca digo que não à proletária costela mendinha assada no forno com as batatas da Guarda e os grelos de nabo da mesma proveniência.

Encerro com umas linhas sobre os vinhos desta zona, longo tempo considerados inferiores por comparação com a  "outra" encosta soalheira onde foi Nosso Senhor servido de colocar a região do Dão. Neste momento os vinhos da Beira Interior estão a subir de qualidade. A casta Roupeiro (aqui designada por Síria) faz belos brancos de guarda, enquanto que a Tinta Amarela, Touriga  e Roriz fazem bons tintos em Pinhel, Figueira de Castelo Rodrigo e na Cova da Beira.

Por mim gosto do trabalho que Luis Roboredo está a fazer na Mêda, com a sua marca "Gravato". Boa relação qualidade \preço e excelentes vinhos, brancos e tintos. E tem um Palhete notável. Até pela raridade. Que não deve ser confundido com o Rosé!!

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