quinta-feira, fevereiro 22, 2007

Catacuzes;Carrasquinhos;Espargos e Azedas


O pobre camponês alentejano sempre fez das fraquezas forças e conseguiu, através do seu engenho, combater admiravelmente a fome (e outras limitações) que lhe eram impostas nos tempos passados.

A forma como o fez tem a ver com a utilização dos humildes produtos da terra, as mais das vezes ervas selvagens a que ninguém " de berço" dava importância, transformando-as em Açordas , Gaspachos ou em guizados e cozidos a que se juntavam umas mãos de carneiro, ou um pouo de toucinho ou ainda os restos de alguma linguiça caseira.

Catacuzes - Nome científico: rumex bucephalophorus. Planta da família das poligonáceas. É frequente nos solos ácidos de Portugal e região mediterrânea. São parasitas do Trigo e encontram-se ao redor das Searas. Excelentes para aromatizar guizados e Cozidos.

Espargos Verdes (ou Selvagens) - asparagus officinalis. Planta vivaz da família das liliáceas e subfamfiia das asparagoideas, com turiões carnudos brancos. O espargo selvagem com o nome científico de asparagus Lenuifolius, difere do espargo hortense por turiões delgados. É espontâneo no Alentejo e óptimo na prepração das Migas ou dos Ovos mexidos.

Azedas - As azedas pertencem à família das Poligonáceas (Rumex acetosa).
Colhem-se as folhas novas antes da floração, uma a uma. Quanto mais freqüentemente se fizer esta apanha, tanto mais forte será a nova folhagem da planta. As folhas consomem-se frescas, porque quando secam perdem quase por completo as suas virtudes como condimento. As folhas, o menos apertadas possível, colocam-se em camadas ligeiras, num lugar ventilado e escuro, sem lhes tocar nem virar. Empregam-se como salada e na confecção de sopas.

Carrasquinhos (ou carrascos) - Muitas espécies vegetais são muito atreitas a solos ricos em carbonatos (derivados de calcários) ; é o caso de arbustos como o carrasco (Quercus coccifera) da família dos cactos. Utilizam-se em culinária apenas os caules tenrinhos e depois de lhes serem retiradas as folhas agressivas.

"Posta a mesa" com esta introdução pseudo-científica vamos lá então falar da comidinha que tivemos ocasião de provar um destes dias por obra e graça de Santo António (Mendonça):

Entradas: - Salada de Azedas, ovos mexidos com espargos verdes e linguiça de porco preto.

Prato Principal - Mãozinhas de Carneiro com grão, Catacuzes e carrasquinhos . Em guizado lento e oloroso apuram-se as mãozinhas impecavelmente limpas de todas as peles e impurezas, juntando-lhes o grão, os caules de catacuzes e dos carrasquinhos para melhorar o sabor. Para a panela entra também um meio chouriço artesanal de porco preto partido aos bocadinhos. O refogado é simplesmente feito em azeite do melhor (alentejano pois então!).

Bebeu-se um Vinho sem marca feito em casa do Luis Corte-Real, só com castas aprovadas da Região do Dão. Excelente para este tipo de produto sem pretensões e que ajudou à nossa simulação de refeição de "camponês pobre"...

Enquanto discutiamos estas questões filosóficas da fuga às severas restrições da vida no campo do alentejano pobre, bebendo uma antiquíssima aguardente bagaceira branca Casa dos Cunhas (maravilhosa! Bem melhor do que a Brejoeira, referência absoluta destes digestivos) houve quem afirmasse - com muita razão:

"Isto que hoje aqui comemos transformou-se em comida de ricos - Quem é que tem tempo de andar pelos campos a apanhar os carrascos e as azedas, de limpar as mãos de carneiro e de desfolhar os catacuzes na seara? Só quem não tem mais nada para fazer!!"

E esta Hein?! É a vingança dos Pobres...

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