sexta-feira, janeiro 30, 2015

Para Descansar a Vista

É sexta feira e antes de ir buscar ao hotel o meu colega dos correios franceses  - Temos hoje uma reunião de trabalho ( a pedido dele)  com o Director do mercado filatélico e da impressão  da La Poste -  aqui venho deixar o habitual poema antecipador do fim de semana.

Vai chover, mas estará menos frio.

Antecipo um Sábado sem grande trabalho à frente dos tachos, porque as minhas santas querem "ir às compras", o que representa maior responsabilidade para o almoço de Domingo...

Enquanto penso na ementa e ouço a chuva lá em baixo, aqui deixo 3 poemas de meu mestre Eugénio de Andrade, talvez quem melhor  traduziu para palavras a melancolia da chuva:

"É quando a chuva cai, é quando
olhado devagar que brilha o corpo.
Para dizê-lo a boca é muito pouco,
era preciso que também as mãos
vissem esse brilho, dele fizessem
não só a música, mas a casa.
Todas as palavras falam desse lume,
sabem à pele dessa luz molhada."
 
"As primeiras chuvas estavam tão perto
de ser música
que esquecemos que o verão acabara:
uma súbita alegria,
súbita e bárbara, subia e coroava
a terra de água,
e deus, que tanto demorara,
ardia no coração da palavra."
 
"A chuva, outra vez sobre as oliveiras.
Não sei por que voltou esta tarde
Se minha mãe já se foi embora,
Já não vem à varanda para a ver cair,
Já não levanta os olhos da costura
Para perguntar: Ouves?
Oiço, mãe, é outra vez a chuva,
A chuva sobre o teu rosto."
 

 
 

Um comentário:

  1. esses poemas lembraram-me (por alguma razão) este outro, chamado "fotografia da chuva"

    bátega

    ao deslizar suavemente pelas ruas da cidade
    deserta
    sentem-se as gotas grossas pipocar no chão espelhado
    sentem-se, adivinham-se, mais do que se vêem

    como uma massagem feita no lado interior do crânio
    cada gota vai subtraindo uma tensão
    daí uma calma que não é normal
    perturba
    — precisamente pelo excesso de calma

    anestesia
    a vida em câmara lenta
    não há destino
    não há fim nem da bátega
    nem do suave deslizar

    não há pressa
    nem as nuvens têm pressa de despejar a sua carga
    nada vai acabar
    a bátega pode durar para sempre
    tal como o suave deslizar
    pelas espelhadas ruas pipocantes da cidade.

    ResponderExcluir